5 meses

Foi já há 5 meses que recebi o telefonema: que me tinham roubado o meu primo. Que tinham roubado o sobrinho da minha mãe. Mas pior, que tinham roubado o irmão da minha prima, o filho dos meus tios.

O filho dos meus tios.

…o filho dos meus tios…

Continuo a reviver tudo como se tivesse acontecido ontem. Aquela semana de horror, de revolta, de raiva. Aquela semana de dor. Minha, da minha mãe. Aquela semana de terror e de algo indescritível, pior que dor, dos meus tios e da minha prima. Aquela semana que numa madrugada nos roubou o meu primo, e levou com ele a minha prima e os meus tios. Que nunca mais foram os mesmos. Como poderiam sê-lo? Como poderão voltar a sê-lo?

Ainda não chorei. Ainda não consegui chorar o que tenho engasgado cá dentro sempre que revivo aquela semana que durou uma eternidade, que passou em menos de 5 minutos.

De vez em quando, a voz embarga-se, treme, caem umas lágrimas. Poucas. Nunca aquelas todas que já deviam ter saído e que continuam a consumir-me por dentro. Porque me roubaram o meu primo, porque me transfiguraram a minha prima e os meus tios.

E falo disto sempre que posso. Sempre que alguém esteja disposto a ouvir-me. Porque preciso. Porque não posso guardar cá dentro o que me corrói. Porque ainda não esgotei a raiva, a revolta que vai cá dentro.

Porque quem está na Carregueira está melhor do que estão a minha prima, os meus tios. E simplesmente está, enquanto o meu primo já não.

Não me peçam “menos”. Não me peçam para não “remexer no assunto”. Dêem-me a mão quando precisar. Como quando, há duas semanas atrás, revivi tudo numa questão de segundos só de saber que, finalmente, foi formalizada a acusação. A maior de todas. E a voz prendeu-se. Elevou-se e tremeu. E as lágrimas, sempre poucas, caíram.

Sei que não posso ter o Alexandre de volta. Mas queria, gostava, de ter a Patrícia, o Tio Zé e a Tia Mimi de volta. E isso, isso nunca irá acontecer. Porque numa madrugada, em menos de nada, num acto que, está comprovado, não foi involuntário, nos roubou uma família inteira.

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