Sair de casa para comprar um castelo. Não daqueles de príncipes e princesas, reis e rainhas. Mas uma peça de uma torneira que se avariou e que de visão romântica de castelos não tem nada.
Pouca vontade de voltar para casa porque o meu espaço está preenchido demais, carregado de mais.
O castelo não serve na torneira. Afinal não é nenhum sapatinho de cristal em Cinderela.
Voltar a sair. Devolver. Querer trocar. Não temos, só este tamanho. Não serve, procuro amanhã noutro lado.
Não ter vontade de sair da loja. Arrastar-me pelos corredores das torneiras. Passar pelos tecidos. Fixar-me nas molduras e quadros. Estas molduras são muito giras, tão simples e com um preço simpático. Crio na minha cabeça um conjunto de molduras numa parede do meu quarto. Sem fotos, porque a ideia é outra. Procuro temas, papéis de fundo. Estes papéis são muito giros, mas não sei… Estes são lindos, mas demasiado grandes e cortá-los é um desperdício.
{o telefone toca. Não, não têm outro tamanho. Já sei onde procurar. Não me demoro, já vou jantar, até já.}
Não me apetece voltar para casa. O meu castelo, que não é de príncipes e princesas, reis e rainhas, o meu espaço que julgava, queria, sagrado foi invadido.
Volto a atenção placas de madeira daquelas tão na moda com frases batidas. Fraquinhos. As mensagens e o design. Mas as molduras. As molduras de cor. Sete cores. Será que têm as sete cores que preciso? Têm mas não são exactamente bonitas. E são do formato tradicional, rectangulares. E o preço não compensa a qualidade.
{não me apetece voltar para casa…}
Os quadros fraquinhos, demasiado vistos, as telas que não dizem nada. Falta-lhes essência, acima de tudo.
Olho para o telemóvel. Notificações sobre o debate da tarde. As mulheres independentes assustam os homens. Sim ou não? Tu assustas por seres quem és, disseram-me uma vez. Fiquei sem perceber se isso era um elogio ou antes pelo contrário. No debate não há grandes desenvolvimentos. A conversa dispersou-se. Respondo quando chegar a casa.
{não quero voltar para casa…}
Pouso os papéis de fundo, volto a olhar para as molduras. Aquela verde menta em forma de casa ficava lá bem. Não. Não vou levar.
Recebo o reembolso do castelo que não {me} serviu.
Não. Decididamente não me apetece voltar para casa. Outra vez. Se dúvidas ainda existissem, hoje desfaziam-se. É um cenário impossível. Já teve o seu lugar no Tempo e no espaço.
Não quero voltar para casa. Mas volto. Porque há dois príncipes no meu castelo à minha espera. E esses dois príncipes são quem me faz respirar fundo e suportar mais um dia e meio que ainda tenho pela frente de invasão e regresso ao passado.
Eles fazem-me bem. Eles fazem-me melhor.
E por ser melhor ausento-me para uma volta ao quarteirão para ver a minha Lua. Que já não está Cheia. Que já não é Super. Mas que é linda. É minha. E está lá sempre. Mesmo quando o meu castelo é invadido.