Como se sobrevive no fundo do poço, onde falta o ar, falta a luz, falta a cor?
Já lá estive antes. Não me recordo como saí… Ou recordo-me. Até bem demais. Três dias em silêncio até que um murro na mesa me trouxe de volta.
Não vai haver murro na mesa desta vez. Não há murro na mesa há muito tempo, desde o dia “já não posso fazer nada por ti”. Porque um cobarde é um cobarde é um cobarde.
Há, sim, várias luzes de presença. Que me chamam, que tentam puxar por mim. Mas eu não sei, já, como voltar para cima. Como corresponder ao chamamento dessas luzes de presença. Onde está a energia, a força, para me trazer de volta à superfície.
Dizem que faz parte. Dizem que sou forte. Dizem que vou conseguir. Digo que até lá, um dia atrás do outro atrás do um, o esforço para sobreviver é demasiado grande, demasiado doloroso, demasiado violento.
Onde vou para encontrar essa tal de força que me dizem que tenho? Onde vou para respirar quando o ar não entra e a voz não sai? Onde vou para regressar à superfície?
Afogo-me todos os dias um pouco mais. Apago-me todos os dias um pouco mais.
Como se sobrevive no fundo do poço, onde falta o ar, falta a luz, falta a cor? No fundo do poço onde estou eu, onde falto eu.