Category Archives: {42 dias}

{#212.154.2023}

9 anos hoje em que o meu corpo expulsou de mim o que não era para ser. Ou o que não podia ser. Ou…

9 anos hoje de colo vazio.

Mas o que não posso trazer no colo, o meu filho, trago na pele tal como o vi no dia em que o meu corpo disse “Não”. E na pele fica para sempre. No braço esquerdo. Junto do coração. De onde nunca saiu desde o primeiro dia ainda que os dias tenham sido apenas 42.

9 anos hoje.
Como se tivesse sido ontem. Como se fosse hoje…

E lembro-me daquele dia de calor horrível e céu cinzento. Que começou a chover ao mesmo tempo que eu começava a chorar…

Hoje já não choro. Não por falta de vontade. Porque hoje, depois do trabalho, só me apeteceu chorar. Não aconteceu. Como agora nunca acontece. Simplesmente não consigo chorar. E hoje precisava. Muito. Tanto. Porque o colo mantém-se vazio. E vazio estará sempre. Para sempre. E para sempre é muito tempo.

Nove anos. 9. E foi ontem. Foi hoje. É todos os dias. 9 anos…são mais de três mil dias. São, na realidade, 3287 dias e noites e uma imensidão de tempo que passou a correr e tão devagar.

E o colo mantém-se vazio…

{#212.154.2022}

Oito anos depois de 42 dias. Colo vazio. Para sempre.

Ainda é um dia que me dói, que me pesa. O tempo, admito, tem ajudado. Não a esquecer porque não se esquece, mas a atenuar a dor e a saudade. Mas o colo, esse, estará para sempre vazio. E é isso que dói. Saber que sim, estive grávida por 42 dias, mas não tenho o meu filho. E sinto muito a falta de dar e receber colo. Aquele colo de mãe que não sou porque não tenho o meu filho.

Oito anos, como se tivessem sido apenas oito dias. Tanta coisa aconteceu, tanta coisa mudou, outra tanta permaneceu igual. Eu? Acho que me perdi pelo caminho e ainda não me reencontrei totalmente. Tento criar novas memórias que também me relembrem quem sou. Não apenas o que sou. Porque o que sou eu sei dizer. Mas quem sou fico sempre na dúvida.

Sei também o que não sou. Não sou mãe. Por muito que algumas pessoas me digam que sim, que o sou, na verdade não sou. Não cheguei a ser. E esse vazio dói ainda. E acredito que nunca deixará de doer.

Quis fazer do dia algo de diferente. Não fiz. E tive o último jantar que queria ter, com as últimas pessoas com quem queria estar. Porque o meu filho devia estar ali, com aquelas crianças da mesma idade. Mas não esteve. Nunca estará.

Os anos vão passando e eu não duvido que, numa história que envolve duas pessoas, eu sou a única que a recorda e revive. A outra metade desta história simplesmente desapareceu. Há alguns anos… E, claro, no entender dele a culpa de ter desaparecido é minha. Porque, e não me esqueço, “tu és instável, sempre foste”. Para alguém que não quer problemas, quer soluções, como apregoa para quem o quiser ouvir, esquece-se de que todas as soluções têm consequências. E, neste caso concreto, as consequências ficaram todas para mim.

“Eu vou estar sempre aqui” ou “o tempo que precisares” foram promessas que duraram pouco. Porque esse sempre não durou muito e o tempo que eu precisar foi-me negado, porque ao fim de oito anos ainda preciso desse tempo.

Oito anos que podiam ser oito dias. 2922 dias. Como se fosse ontem.

Tenho vontade de chorar. Mas não consigo. Sinto apenas. E preciso do meu espaço e do meu tempo para sentir… Apenas isso.

Sei que amanhã será um dia melhor. Hoje foi duro, mas amanhã será melhor. Volto ao trabalho depois das férias, volto a ocupar a cabeça. Sim, será melhor.

Por hoje resta-me sentir a ausência, a tristeza, a dor que ainda me acompanha. Mas sei que, também isto, vai passar. Ou, pelo menos, acalmar. Mas hoje tenho todo o direito de simplesmente sentir…

{#212.154.2021}

7 anos hoje. Que parecem 7 dias. Que parecem 7 vidas.

Mas hoje já não choro. Já consigo pensar naquele dia de há 7 anos de forma mais serena. Se já consigo aceitar tudo como aconteceu? Ainda não. Se consigo perdoar quem me magoou tanto por causa do que aconteceu? Também não. Se já esqueci? Não se esquece o que fica para sempre.

Mas já não deixo os olhos no chão. Insisto em olhar para cima, mesmo que a custo. Como custou hoje.

Bola para a frente, dizem-me. Sei que sim, o caminho é esse. E apesar de ainda olhar para trás, já não me deixo lá ficar.

Ainda dói cá dentro. Mas já é uma dor diferente. Mais calma. Que já não queima. É saudade, acima de tudo. E o vazio de quem não está, porque não era para estar. Porque não era para ser. Não podia ser.

Não, não foi um dia bom. Foi o que foi. Passou a muito custo, mas passou. Com um peso no corpo como há muito tempo não sentia.

Viro mais uma página no calendário. 7 anos. E a vida toda pela frente…

{#170.196.2021}

Faz hoje 7 anos que engravidei. Vou continuar a fazer de conta que não me lembro. Vou continuar a fazer de conta que não me lembro que hoje o meu filho teria 6 anos e deveria estar aqui comigo.

Vou continuar a fazer de conta que não me lembro do período muito negro que veio depois dessa gravidez que não foi, que não podia ser.

É, vou continuar a fazer o que sei fazer melhor: fazer de conta…

{#72.294}

Às vezes a saudade dói. Outras, como agora, apenas se faz mais presente.

Tenho saudades do filho que não me chegou a ser. Mas que me é tudo, que é meu. O meu filho.

{#página212} 

Vi-te assim, pequenino e indefeso, quando o meu corpo te expulsou de mim. Faz hoje 3 anos. Nunca consegui esquecer o que senti quando te vi e durante muitas noites acordei assustada porque era assim que te revia nos meus sonhos mais difíceis.

Vi-te assim muitas vezes mesmo estando acordada e de olhos bem abertos. Vejo-te ainda.

Não sei se seria melhor não te ter visto. Sei, sim, que apesar de tudo fiquei com uma imagem tua gravada na memória. E talvez seja melhor ter essa imagem do que não ter nada. Porque, na verdade, de ti nada mais tenho do que a memória de 42 dias que me duram há 3 anos.

Não sei como é que já passaram 3 anos. Apenas as folhas do calendário me confirmam que sim, que o tempo passa sem pausas para processos de luto e recuperação. Sei que um dia atrás do outro atrás do um. Sei que todos os dias mais um passo em frente e, por vezes, tantos passos para trás. Sei que todos os dias faço por tirar os olhos do chão como prometi a mim mesma há 3 anos. Não é fácil. Não é fácil encontrar um sentido em tudo isto. Não é fácil manter a confiança diariamente que tudo vai ser melhor. Não é fácil avançar mais um dia quando pouco ou nada faz sentido porque há 3 anos que não te tenho comigo.

Sei que te preocupas comigo quando os dias são mais doridos, assustadores. Sei que queres que esteja bem, tranquila e em paz. Sei porque tu mo dizes tantas vezes quando preciso de ti e não te tenho aqui, mas estás aí. Sei que não me queres mal apesar de não ter sabido proteger-te quando precisaste de mim. Sei que não precisaste de me perdoar porque no teu mundo apenas existe amor e nunca rancor. Sei que olhas por mim e que chegas até mim tantas vezes, todos os dias.

Hoje trago-te na pele. Como as memórias à flor da pele, de hoje em diante trago-te gravado em mim. De hoje em diante, 3 anos depois, posso tocar-te, sentir a pele que é a minha, sentir-te na pele que tantas vezes me queima e que tu fazes por acalmar. De hoje em diante és palpável, és físico, és ainda mais real. Até para aqueles que te querem esquecer. Não tens voz, mas tens a minha a falar por ti. Não tens cheiro, mas tens o da minha pele.

Sei que sabes que é possível amar quem não está aqui. Amo-te desde o dia em que soube de ti em mim. Cheguei a pensar que o tenhas duvidado. Sei hoje que nunca duvidaste porque sempre o soubeste. E é possível amar assim, sem toque, sem cheiro, sem voz.

Passaram 3 anos. Passaram 3 anos desde que te vi assim, pequenino e indefeso. Desprotegido quando o meu corpo te expulsou de mim.

Passaram 3 anos, 3 anos voltarão a passar e outros 3 e 3 outros. E, passem os anos que passarem, estarás sempre comigo e em mim.

Ficarei melhor, todos me dizem que sim. Irei renascer, reflorescer, reencontrar-me. Mesmo que tantas vezes ainda o duvide. Mesmo que tantas vezes ainda grite em silêncio esta chama que me queima por dentro. Só preciso de acreditar que vou conseguir continuar a ter força para manter o ritmo, um dia atrás do outro atrás do um, tirando os olhos do chão.

3 anos. Tanto tempo. E a memória fica para sempre. Agora gravada na pele que é a tua e que é a minha. Porque és e serás sempre o meu filho.

{#página117} 

1001. Depois de 42.

1001 dias. 1001 noites. 1001 vezes o Sol nasceu. 1001 vezes o Sol se pôs. Afinal parece que o teu pai tinha razão, que nada iria mudar, que nada mudou, quando me disse na última vez que o vi: “o Sol continua a nascer e a pôr-se todos os dias”.

Tudo mudou. Claro que tudo mudou. Mudei eu. Mudou o teu pai. Mudou o Mundo como o conhecia antes de ti. Mudou a minha forma de amar também. Porque deixei de amar apenas aqueles que de alguma forma estão perto, que conheço as feições, que posso tocar, que posso ouvir, que posso cheirar. Aprendi que é possível amar quem nunca se viu. Não…não é verdade que nunca te tenha visto…… Vi-te quando o meu corpo te expulsou de mim. Vi-te perfeitamente definido, contornos perfeitos de um bebé de 42 dias de gestação. As mãozinhas que já se percebiam, a cabeça, o que viria a ser as perninhas se te tivesse mantido comigo, em mim, por 40 semanas e não apenas 42 dias.

Aprendi a amar de forma diferente. Porque tudo mudou. Aprendi que é possível alguém viver em nós em cada segundo de cada hora de cada um dos 1001 dias depois de 42 e mais além. Aprendi que é possível amar quem nunca se tocou, quem nunca se ouviu, quem nunca se cheirou. Não vou dizer que nunca te senti. Porque também aí estaria a mentir. Porque da mesma forma que te vi quando o meu corpo te expulsou, também te senti a soltares-te de mim. Não posso dizer que tenha sido um parto. Mas apenas uma expulsão…

Aprendi que é possível amar quem tão pouco tempo teve para ser mais mas que hoje é, para mim, tudo o que de melhor eu tive. E que não soube cuidar.

Aprendi que é possível amar quem já só existe em mim, comigo. Que não é visto nem sentido por mais ninguém mas que existiu, foi real, foi meu, parte de mim, em mim.

Aprendi, também, que nem sempre posso falar abertamente por saber que poucos irão entender o porquê de falar de 42 dias. Aprendi, também, que é preferível o silêncio, as lágrimas escondidas, o fazer de conta. Porque, aprendi, só existe para o Mundo aquilo que foi palpável.

No meu mundo existes tu. Mesmo que tenham já passado 1001 dias, 1001 noites, de vazio depois de 42. Existes mesmo que não te veja, não te sinta, não te oiça, não te cheire. Existes quando penso em ti 24 horas por dia, todos os dias, há 1001 dias, 1001 noites.

Aprendi a amar desta forma estranha para os outros. Mas que é a única forma que tenho de te amar. Aprendi que só é permitida e aceite a tua existência sem julgamentos 2 vezes por semana dentro daquelas 4 paredes onde procuro por mim. Ali é-me permitido que existas. Ali é-me permitido que te ame. Que fale de ti. Que fale por ti. Que fale para ti. Ali é-me permitido ser da única forma que posso ser mãe. Sem julgamentos. Sem críticas. Apenas amor, o meu. Por ti.

Não soube ser mãe de outra forma. Peço-te desculpa por isso todos os dias. E sei que me ouves, me vês, me sentes. E me queres bem. Ainda que seja cedo, mesmo 1001 dias depois da tua ausência.

Aprendi tanto, meu amor. Aprendi que não é doentio, como me disseram, contar os dias da tua ausência. Aprendi que a contagem dos dias é a única forma que tenho de me lembrar que exististe, que existes. Como se algum dia me fosse possível esquecer-te.

Tudo mudou. O Sol continuou a nascer e a pôr-se. 1001 vezes. Mas tudo mudou. Começando por mim, mesmo que ainda não te saiba dizer quem sou hoje porque continuo à procura de mim.

A única coisa que não mudou? O facto de não estares aqui, comigo, ao meu lado. Mas aprendi que é possível mudar a forma de amar. Como mudou a minha.

1001 dias. 1001 noites. Sem ti. Mas não deixo de te amar. Todos os dias. Porque, para mim, existes. Em mim. Todos os dias.

{#página94} 

Tenho saudades da minha gravidez… 

…mesmo que tenha durado apenas 42 dias. Mesmo que já tenham passado 978 dias depois de 42. 

{#página66} 

Já devias saber que muitas vezes ouves comentários que te fazem doer. Aliás, sabes que sim. Ainda é difícil ouvi-los, mesmo que em por acaso em linhas de conversas cruzadas. Mesmo que não sejam dirigidos a ti.

Podes ter vontade de te levantar e dizer “vamos mudar de assunto” ou até “e que tal não falarmos disso” ou ainda “não fales do que não sabes”. Podes ter vontade de intervir e expôr o que sentes, o que pensas e o que, de facto, sabes. Porque sabes mais e melhor do que quem puxou o assunto que apenas sabe de ouvir falar. De ouvir dizer. De experiências de terceiros.

Podes ter vontade disso tudo. Tens esse direito. Porque não é o tempo que durou uma experiência que lhe vai atribuir maior ou menor importância. Que lhe vai dar maior ou menor valor. Que vai dar maior ou menor sofrimento na hora da perda.

Uma perda é uma perda. Uma perda inesperada será sempre uma perda inesperada. Seja um amigo, seja um familiar, seja um filho.

Seja um filho às 8 semanas que foram 42 dias, seja um filho às 19 semanas, seja um filho aos 6 meses, seja um filho aos 4 dias, seja um filho aos 28 anos.

Uma perda será sempre uma perda. Não importa quanto tempo durou. Um filho será sempre um filho. Não importa quanto tempo esteve por perto. Fará realmente diferença a questão do tempo?

Já devias saber que muitas vezes ouves comentários que fazem doer. Comentários que desvalorizam a tua perda porque, afinal, foram só 42 dias. E vais ter vontade de intervir. E de dizer que a dor da perda de um filho não se quantifica. Não é a quantidade de tempo que vai definir quem sofre mais. Se a mãe que não o chegou a ser porque não passou de 42 dias de gestação ou se a mãe que nunca deixará de o ser apesar da perda com 28 anos.

Uma perda é uma perda. A perda de um filho é a perda de um filho. Não é quantificável. Muito menos é comparável.

Já devias saber que muitas vezes ouves comentários que fazem doer. E que nessas alturas volta tudo à superfície. E apetece gritar, apetece fazer má cara, apetece sair dali.

Já devias saber. E, no fundo, sabes. Simplesmente ainda não te habituaste. Não sei se alguma vez te irás habituar. Mas não podes, nunca!, esquecer-te que sim!, tens direito à tua dor da tua perda. E que não!, ninguém tem o direito de a desvalorizar, quantificar, comparar. Porque uma perda é uma perda. Uma perda de um filho é uma perda de um filho. E a tua perda do teu filho é a tua perda do teu filho.

Uma perda é uma perda. Mesmo que tenham sido 42 dias.

A minha perda é a minha perda.

A minha perda do meu filho é a minha perda do meu filho. Mesmo que tenham sido 42 dias.

Há 950 dias.

{#página41} 

Crueldade é alguém que acabas de conhecer te dizer “Ainda bem que o seu bebé não nasceu. Isso era egoísmo. Como é que ia cuidar dele agora com essas dificuldades? Como é que ele ia estar agora? Ia estar a passar fome, como é que você fazia? Matava-o, era?! Era?! Isso era ser muito egoísta! Problemas tem a minha amiga que tem cancro!”

De todas as barbaridades que tenho ouvido ao longo dos últimos 2 anos e meio esta supera tudo. É cruel. É maldoso. É desumano. É surreal. É inominável. É impossível de ter sido dito. Mas foi. Por uma mulher. 

Fica aqui para memória futura. Fica aqui para me recordar porque é que hoje baixei os braços mais um pouco. Porque é que desisti mais um pouco. 

Porque se já não me sentia com força suficiente para continuar, depois de hoje a força que precisava está completamente esgotada. Não existe. 

Isto não se diz. A ninguém. 

Mas isto foi dito. Hoje. A mim. 

{um cobarde é um cobarde é um cobarde} 

Um cobarde é um cobarde é um cobarde.

Um cobarde é o que diz a quem o quiser ouvir que não quer problemas, quer soluções. Esquecendo-se das consequências das soluções dos problemas.

Um cobarde é o que nega as consequências acreditando que são apenas danos colaterais quando, na realidade, são danos directos das soluções dos problemas.

Um cobarde é o que, depois de encontrada a solução, atira para debaixo do tapete as consequências e finge que não existem.

Um cobarde é um cobarde é um cobarde.

Alguém que lhe diga que não é por agora se dedicar ao voluntariado que a consciência lhe fica mais leve. Até porque um cobarde simplesmente não tem consciência para lhe pesar. E não serão as acções de voluntariado que agora apregoa que lhe vão trazer o que nunca teve: a dignidade de ser algo mais do que um cobarde.

Espalhe-se a palavra. Porque é sempre importante recordar a um cobarde que nunca passará disso mesmo, um cobarde. E a idade para se fazer homenzinho já vai longe.

Um cobarde é um cobarde é um cobarde. E nunca será mais que um cobarde.

{#página22} 

“Um dia, se fores mãe”

“Quando fores mãe entendes”

“Mas tu não és mãe”

“Netos só for pelo teu irmão porque de ti não vem nada, né?”

…………é, de mim “não vem nada“…………

{da cobardia} 

​Existem os cobardes. E depois existes tu. COBARDE DE MERDA! Sim, tu que te recusas a enfrentar os problemas que TU próprio criaste, que preferes ESCONDER-TE e FUGIR e FINGIR que “no pasa nada”! 

COBARDE DE MERDA! Sim, TU que recusas uma conversa, UMA PORRA DE UMA SIMPLES CONVERSA que há MESES te peço para poder pôr um ponto final em PAZ! 

COBARDE DE MERDA! Sim, TU que “não queres problemas, queres soluções” e te RECUSAS a ser homenzinho e a ENCARAR um problema que TU PRÓPRIO contribuiste, e MUITO, para criar. TU que só queres saber de soluções mas que FOGES COBARDEMENTE quando a solução é tão simples. 

COBARDE DE MERDA! Problemas todos temos, blá blá blá Whiskas saquetas! Pois hoje EU tenho um problema GRANDE que se está a tornar GRAVE, e tenho a solução para ele. Mas TU, como COBARDE DE MERDA, ESCONDES-TE, FOGES, APAGAS-ME do teu mundo como se eu não existisse. 

EU é que estou no FUNDO DO POÇO e TU é que estás incomodado com isso?! TU é que foges, não sou eu quando tudo o que eu queria era NÃO TER CHEGADO a este ponto. E SIM, a cada dia que passa contribuis mais e mais para que me afunde mais um pouco quando me PROMETESTE que NÃO iria suportar tudo sozinha. E onde é que estás hoje? ESCONDIDO. Em FUGA. 

Nunca te imaginei cobarde. Afinal descubro-te um COBARDE DE MERDA! 

Não vai ser a tua atitude mesquinha, baixa, sem um pingo de integridade e absurdamente cobarde que me vai derrotar. Porque eu sou MAIS do que isto, este estado miserável que nunca procurei mas de onde irei sair à força de drogas se tiver que ser e com a força de quem me tem aquilo que TU desconheces: RESPEITO. Sou MUITO MAIS do que aquilo que tentaste que fosse. Sou muito mais que uma noite de copos. Sou muito mais do que um boneco com que se brinca só quando apetece. 

Já TU serás SEMPRE um COBARDE DE MERDA enquanto te mantiveres em fuga dos problemas que TU ajudaste a criar. Cresce! Enfrenta! Incomoda-te? Acredita, este estado miserável que nunca quis não te incomoda mais a ti do que a mim! 

COBARDE DE MERDA. E, percebi há relativamente pouco tempo, profundamente EGOÍSTA.

PS: apesar de tudo, não te desejo mal nenhum. Apenas desejo que NUNCA passes por isto. Mas depois lembro-me que os cobardes e egoístas são demasiado fracos para se permitirem SENTIR seja o que for com um mínimo de intensidade. Porque até SENTIR os assusta.

{“há pessoas que estão pior do que tu”}

Dizer a alguém, que está a passar por um momento menos bom, que “há pessoas que estão pior que tu” , pode ser bem intencionado. Não duvido que seja na grande parte das vezes.
Não deixa, ainda assim, de ser das piores coisas que se podem dizer. Dizer a alguém, que está na merda, que “há pessoas que estão pior que tu”, é desvalorizar o sofrimento do outro, é pintá-lo como egoísta que só pensa nas próprias dores quando no mundo lá fora há tragédias tão maiores todos os dias (que as há), é simplesmente anular o outro e o seu direito a sentir e a gerir da melhor maneira que pode e/ou sabe o que sente e como sente.

Dizer a alguém, que não consegue a determinado momento reagir da forma que todos acham que deve reagir, que “há pessoas que estão pior que tu, e isso já passou e tens que dar a volta por cima” é uma tentativa de apagar pedaços da história individual de cada um, como se não tivessem existido, como se não tivessem acontecido, como se não fizessem parte do processo de crescimento de cada um.

Dizer a alguém, que não esquece por muito que lute para não se lembrar, que “há pessoas que estão pior do que tu” é exactamente o mesmo que dizerem, como há dois anos me disseram, que “se não aconteceu não é para ser falado”.

Quando alguém está a passar por um momento menos bom, acreditem: não procuram que lhe digam frases feitas nem bonitas. Não procuram que lhe digam absolutamente nada. Procuram, sim, quem os oiça. Sem julgamentos, sem cobranças, sem respostas prontas em forma de clichés. Procuram simplesmente quem lhes permita ser, estar e sentir. Procuram, acima de tudo, espaço para se isolarem se assim o quiserem, um ombro para chorar se assim o entenderem, um abraço para se fortalecerem se assim o precisarem, e silêncio para falarem se assim o fizerem.

Não. Dizer a alguém que está na merda que “há pessoas que estão pior que tu” não é ajudar. É exactamente o oposto.

Se querem realmente ajudar alguém que não está bem, não digam nada. Ou digam apenas “estou aqui se me quiseres aqui”, e estejam lá realmente. Só assim conseguem que o outro, o tal que está na merda, que chora, que tenta por todos os meios atenuar a dor que vocês não vêm mas que existe, só assim conseguem que o outro sinta que, afinal, há quem respeite o seu sofrimento, a sua dor. Mesmo que não a entenda. Porque não tem que entender. Apenas respeitar.

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{do dia da Mãe}

No último dia da Mãe escrevia isto.

Desde o primeiro dia que oiço dizer que o tempo ajuda. Que acalma a dor, porque é dor o que realmente se sente. Que tudo fica melhor. Que tudo fica mais tranquilo.

Talvez. Talvez ainda não tenha passado esse tal tempo no meu Tempo. Talvez esse tal tempo seja um conceito relativo. Ou talvez nem sequer exista.

Não procuro a memória. As memórias. Estão todas cá. Intactas. Intensas. Todas elas.

Procuro, isso sim, encaixar e avançar. De certa forma tenho conseguido. Com altos e baixos, baixos que já não são tão baixos como noutros tempos. Com avanços e retrocessos. Faz parte, penso eu. Sei que tenho ainda muita coisa para arrumar nesta gaveta. Gaveta que não fecha por estar demasiado desarrumada, desorganizada.

Sei que há coisas que oiço, que me dizem, que são inocentes, sem intenção de magoar, são coisas simplesmente banais. Dizerem-me “tens sorte porque não tens que ir a correr para casa tratar dos filhos”. Não lhe chamaria sorte. Preferia mil vezes perder o pôr do Sol na praia por ter ido a correr para casa tratar do meu filho.
Ouvir no escritório, a um domingo, pedirem desculpa à colega do lado “por lhe ter estragado o dia da Mãe. Eu sei que ela não tem filhos e você tem as miúdas”, sendo que “ela” sou eu e estava ali, presente. “eu não ligo nenhuma ao dia da Mãe, mas você tem as miúdas” e os olhos cedem às lágrimas, o ar não entra, e digo entre dentes que adorava não ligar nenhuma ao dia da Mãe e antes que o choro fique incontrolável vou lá abaixo e já venho e espero pelo elevador com as lágrimas a escorrer e desço do quinto andar a chorar compulsivamente como há muito tempo não acontecia.

O tempo ajuda, o tempo acalma. Mas esse tempo ainda não chegou ao meu tempo e o resto do dia de escritório é passado a tentar secar os olhos, a tentar respirar, enquanto se preparam papéis de última hora de um navio inesperado. E a tarde é passada na esplanada, ao Sol, sozinha, com os óculos escuros a esconder os meus olhos que teimam em não secar.

O tempo ajuda. Mas se há um ano doeu, hoje doeu ainda mais. E dói. E sei que continuará a doer. Especialmente enquanto a gaveta continuar entreaberta por estar desarrumada. Um dia talvez acalme.

Porque tenho sorte em não ter que ir a correr para casa para tratar dos filhos e em vez disso posso dar-me ao luxo de ir ver o pôr do Sol na praia depois de um dia longo de trabalho. Porque podem chamar-me de última hora no dia da Mãe porque até nem tenho filhos. Ou então é tudo isto mas ao contrário.

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{intoxicated by memories and feelings}

“Tia, como é que se apaga a memória?” perguntou-me, há umas semanas, o meu Um. Não se apaga, Miguel. Respondi-lhe que a memória funciona como uma série de gavetas onde se guarda tudo e onde é mais fácil aceder a umas do que a outras, mas que nunca podemos apagar a memória.

Ao mesmo tempo repetia para mim mesma “não se apaga. Não se apaga, mas era tão bom que se apagasse…”

“Mas eu quero apagar a memória, tia. Quero apagar a memória de ti” respondeu-me meio a rir, meio sério. Ri-me com ele. “E quero que tu apagues a memória de mim” riu-se novamente. Ri-me com ele e disse que isso era impossível, porque ele é o meu Um, parte do meu Todo. Mas, cá dentro, respondia-lhe em segredo que também queria apagar tantas coisas…nunca ele, o meu Um, nunca o meu Dois. Mas o resto…

…o que foi não sendo, ou o que não foi sendo, ou lá o que foi que não foi mas foi!

Não, não é doentio contar os dias. Conto-os. Todos. Para poder olhar para trás e perceber as diferenças entre o dia 469 e o dia 10. Ou mesmo o dia 1 ou o dia 180.

Não, não é doentio olhar para memórias de Facebook, responder a comentários antigos, ou mesmo deixar likes aqui e ali a comentários de outros tempos, de outra vida. Não o faço pelos outros, faço-o por mim, porque de alguma forma me tocam.

Não, não é doentio querer entender o que se passa quando percebo que algo de errado se passa. E pergunto para perceber. E perguntarei as vezes todas que forem necessárias até que me expliquem. Até que me expliques! Porque alguma coisa mudou. E sim, eu mudei. Tanto, ao longo destes 469 dias depois de 19 depois de 42. Porque esses 19 dias depois desses 42, mas especialmente esses 42 mudaram-me. Muito. Tanto que em tantas ocasiões não me reconheci. Outras ainda não me reconheço.

Não, não é doentio querer falar sobre o que aconteceu, mesmo que na minha cabeça ressoe a célebre frase “se não aconteceu não é para ser falado”. É. É para ser falado. Porque doentio é fazer de conta, continuar a fazer de conta que nada se passou. Porque na verdade aconteceu. Foi como foi, como tinha que ser, ou como podia ser, ou seja o que for! Foi o que foi, como foi.

Dói ainda. Muito. Mas dói muito mais pontas soltas, desconversas, ataques sem sentido quando tudo o que procuro é entender o que se passa neste momento. O que foi que mudou de um dia para o outro, uma mudança de 180 graus. Da água para o vinho. Ou melhor, do vinho para a água…

Não, não é doentio lembrar-me todos os dias daquela imagem que se recusa a sair-me da cabeça e que me dói e que teima em continuar a doer, e que teima em não me largar por muito que não a procure. Porque foi a confirmação do fim. Porque foi a confirmação que sim, um dia, 42 dias, estive grávida até que deixei de o estar. Um dia, 42 dias, tive um ser dentro de mim a formar-se, a crescer, até que deixei de o ter. Até que me despedi dele da forma mais cruel e dura e dorida. E essa imagem, que apenas eu vi e que era real e não fruto de imaginação, que era palpável, essa despedida, essa dor está cá. Não passa, por muito tempo que passe. Por muitos dias que conte. Por muitos dias que diga a mim mesma que sobrevivi a mais um dia de memórias que doem.

Doentio? Doentio é não falar. Não poder falar. Quando o que quero é esquecer. Falar para esquecer. Conversar para esquecer. Para encerrar um capítulo que, sei, nunca será encerrado totalmente porque fará sempre parte de mim. Doentio é guardar tudo cá dentro e ser corroída todos os dias por algo que nunca desejei conhecer. Dor. Sim. É dor. Que chega a ser física. Que chega a sufocar. Que chega a apertar. Dói. Muito.

Doentio é ter que aguentar e suportar, sozinha, esta dor. Que, sei, é minha. Apenas minha. Nunca o foi de outra maneira. Sim, acredito que nunca foi mais do que apenas minha. Gostava de acreditar que não, mas é.

Sim, há tanto ainda por conversar. Para falar. Para ser dito. Para ser sentido como numa espécie de catarse. Lamento, mas há ainda tanto para ser resolvido.

Não gosto de pontas soltas. Não gosto de histórias mal resolvidas. E por isso insisto porque gosto, sempre, de perceber o que se passa quando algo está tão errado. Como agora. Porque está.

Sim, escrevo para mim. Mas hoje não em exclusivo. Hoje tento despejar no éter aquilo que, pelos vistos, não posso dizer a quem tenho que o dizer. Porque sei que não será lido. E, mesmo que o seja, nunca será respondido.

Tanto ainda por dizer………tanto ainda por entender. E tanto ainda a doer.

Não. Nada disto é doentio. Doentio é continuar a fazer de conta. Como nos últimos 469 dias depois de 19 depois de 42. Eu gostava de conseguir fazer de conta. Mas o que trago cá dentro não mo permite. Por isso escrevo todos os dias. Para me lembrar das pequeninas coisas que dão cor e valor aos dias, mesmo os mais negros. E para poder olhar para trás e perceber o caminho que já percorri. Que foi feito de altos e baixos. E de baixos muito, muito, muito baixos e sozinha quando não o devia ter sido. Porque se continuou a fazer de conta.

Dói. Não faço de conta, não quero fazer de conta, não posso fazer de conta que não dói. Mas também não posso fazer de conta que entendo o que se passa quando não entendo mesmo. E esse não entender, esse não falar, esse desconversar, apenas me confirma que sim, esta dor é exclusivamente minha. Quando não deveria ser.

A memória. As memórias. Está cá tudo. Gostava de poder apagá-la. Não posso. Mas posso tentar guardá-las, às memórias, todas, numa gaveta. Só peço que não a abram, à gaveta. E que, em abrindo, não remexam. Porque remexer nessa gaveta é o mesmo que reabrir uma ferida que ainda não cicatrizou. Porque cada vez que essa gaveta é remexida, cada vez que essa ferida é reaberta, dói. DÓI! Muito! E eu estou cansada dessa dor………tão cansada dessa dor. E não é preciso muito para abrir a gaveta e remexer em cada minuto, em cada segundo desde o primeiro momento. E vem tudo à tona novamente. Tudo o que senti, tudo o que ainda sinto, físico ou não. E eu não quero mais…não posso mais, não aguento mais. Mas lido com isso. Todos os dias. Sozinha. Sozinha! À minha maneira. Da única maneira possível: um dia atrás do outro atrás do um. Contando os dias. Todos.

……porque estou cansada de fazer de conta. Porque aconteceu. Porque sim, estive grávida. E não, não tenho o meu filho. De quem sinto saudades como nunca senti de ninguém. A quem amo como nunca amei ninguém. Mas não tenho o meu filho. Nem nunca o terei. Nem nunca o poderei ver. Nem ouvir. Nem ver a crescer. Nem ver a mudar com a idade. Nem ter mil imagens diferentes dele com o passar dos anos. Porque a única imagem que tenho, está-me cravada na memória como que a ferro quente: o dia em que o meu corpo o expulsou. E dói. Muito. Tanto. Demasiado. E doentio não é sobreviver a isto. Doentio é, repito, fazer de conta……e eu estou cansada, tão cansada, de fazer de conta que não dói. Que já não dói…

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{the only way to be with you}

Há já algum tempo que não sonho contigo. Ou, se calhar, continuo a sonhar todas as noites e simplesmente não me recordo quando acordo.

Mas não há dia nenhum em que não estejas presente em mim. A todas as horas. A todos os momentos. Os bons e os outros.

E sim, tenho muitas saudades tuas. Mesmo nunca te tendo tido verdadeiramente.

Amo-te muito. Por muito que não me entendam……
E sinto muito a tua falta. Há 436 dias depois de 19 depois de 42……

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{não quero mais}

Durante anos ouvi esta pergunta. Tentava brincar com a resposta. Cheguei muitas vezes a dizer que seria mãe solteira se tivesse que o ser quando tivesse que o ser.

Respondi várias vezes com “it takes two to tango”.

Durante muitos (demasiados?) anos a vontade foi muita. Desde os 16 que “sonhava” com isso.

Vi muitas amigas, mesmo mais novas, a adiantarem-se. E a cada novo adiantamento uma nova frustração. Porque o tempo continuava a passar. E a esgotar-se.

Cheguei a pedir que não me perguntassem. Porque, dizia, essas coisas não se perguntam. Acontecem se tiverem que acontecer.

Hoje, hoje volto a pedir que não perguntem. Hoje, 411 dias depois de 19 depois de 42, não quero mais.

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{Fazer de conta}

Fazer de conta. Ando a ficar perita nisto.

Hoje, como há um ano. Uma calma aparente, a camuflar um turbilhão interior.

Hoje, como há um ano, a precisar de um colo, de um abraço forte, de uma mão a segurar a minha.

Hoje, como há um ano, sem chão, sem rumo, sem força.

Hoje, como há um ano, sem sorrisos ao canto da boca nem brilhozinho nos olhos.

Hoje, diferente de há um ano, sei que amanhã vai ser melhor. E que vou continuar a viver e não apenas sobreviver.

De resto, hoje como há um ano.

{a memória de calendário, o meu pior pesadelo…}

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