Monthly Archives: May 2014

No alarmes and no surprises

E dizia eu hoje que sim, No Surprises de Radiohead é uma boa música para uma pessoa se apaixonar (não são todas as músicas boas para uma pessoa se apaixonar?) mas que não sei o que é isso há muito tempo.

Mentira. Sei. Sei que me apaixono todos os dias. Pelos meus sobrinhos, pelos meus amigos, pelos meus bichos, pelos meus projectos, pelos dias de sol, pelos dias de chuva, pela Lua Cheia ou até mesmo hoje pela Lua Nova.

Mas sim, é verdade, assim sem alarmes nem surpresas, não me apaixono daquela paixão simplesmente porque não. Porque não sei? Porque não quero? Simplesmente porque não. Não sei. Sei que andaram aí borboletas na barriga que, conforme chegaram, esvoaçaram para longe. Sei que andou aí uma borboletagem que não sendo borboletas também ficou pouco tempo. Sei que andou aí um bicho qualquer que foi crescendo e que afinal era paixão, de mim por mim mesma quando percebi que oh bolas, afinal estou viva e mereço mais que isto. Que aquilo. Que…que…que sei lá eu.

{Bruises that won’t heal}

Sim, se calhar é isso, são marcas que não passam, cicatrizes que ficaram. Ou simplesmente cansada. Nem sei de quê ao certo, quando na verdade nem sei o que isso é. Isso o quê? A paixão? A paixão é carne! Sei, isso sei o que é. Não sei o que é estar cansada. Ou sei, bem demais, o que é e não o querer novamente.

{You look so tired and unhappy}

É isto. Não, não é isto, isto. É isto. Esta coisa. Do não querer voltar a estar tired and unhappy.

E percebo assim, de repente, que sou totó o suficiente para não ver o que está à frente dos meus olhos. Ou esteve. Já não sei. Normalmente só vejo mesmo o que não existe. Como os moinhos de vento. Que só eu via. E para além de só eu ver não passavam, não passaram, não passariam nunca disso mesmo: moinhos de vento. Isto se, sequer, existissem.

Mas continuo a gostar de surpresas e de alarmes, alguns. Afinal, são os alarmes que me dizem “estás cá”, cá seja lá onde for, estás aqui, estás agora.

{This is my final fit}

E as surpresas, essas, aparecem do nada. De uma frase, de uma visita, de um olá. De um nada que pode valer tanto e tão aparentemente pouco e que no fundo é tudo.

Não, há muito tempo que não me apaixono, daquelas paixões de arrebatar e de fazer flutuar pelo menos 2 palmos acima do chão, tal é a força das borboletas na barriga. E muito provavelmente não saberia reconhecer uma paixão do outro lado, porque, lá está, sou totó a esse ponto.

{my final bellyache with}

Mas sei que surpresas, surpresas boas, existem e aparecem todos os dias, com coisas tão pequeninas, que só de olhar para elas percebo que afinal me apaixono mesmo todos os dias. Sem nós na garganta, sem borboletas na barriga que fazem flutuar dois palmos acima do chão. Mas sim, apaixono-me sem carne, apaixono-me porque sim.

{No alarms and no surprises please}

Com alarmes, por favor. Com surpresas, por favor. Os alarmes recordam-me de mim mesma. As surpresas recordam-me dos outros para lá de mim.

Um dia, um dia quem sabe, já amanhã ou daqui a uns anos, um dia volto a apaixonar-me. Paixão de carne. Paixão de borboletas. Com ou sem música. Não, decididamente com música porque todas as grandes paixões trazem uma banda sonora associada. E esta, esta podia de facto ser uma boa música para alguém se apaixonar. Podia, não. Foi. Não eu. Nada teve que ver comigo. Mas sim, é uma boa música para uma pessoa se apaixonar. Ou para acompanhar uma paixão. De carne ou sem ela.

Um dia. E nesse dia, afinal, vou perceber que me apaixonei mesmo sem alarmes e sem surpresas. E sim, aí estarei surpreendida. Alarmada também. Mas aí, aí vai ser tarde. Ou vai ser cedo, não sei. Não quero saber. Vai ser a hora certa para me deixar ir, para me deixar levar. Porque há muito tempo, tanto tempo que não me lembro quanto, há demasiado tempo, 1 ano? 2 anos? 3 meses? 2 semanas? Há tanto tempo que não me apaixono.

Que venha a vida, o aqui e agora, os alarmes, as surpresas. Quero-os todos. Assim. Com tudo.

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Dos prognósticos muito reservados ao copo meio cheio

A culpa é da Lua. Sempre. Porque gosto de a ver, sozinha ou acompanhada. Eu, porque ela, a Lua, tem sempre a companhia das estrelas.

Gosto de olhar para ela, lá em cima, tão longe, mas cuja luz nos chega como se estivesse já aqui à mão. Eu sei, a Lua não tem luz própria, apenas reflete a luz do Sol. Mas ilude-nos acreditando que ela, a Lua, brilha.

Queria ver a Lua hoje. Que está em Quarto Minguante com uns meros 20% a deixarem-se ver. Mas, ao fim da tarde, os prognósticos eram muito reservados. Até que tudo mudou e o céu abriu para que esses tais 20% se possam mostrar em todo o seu esplendor.

20% não é quase nada, é certo. Mas 20% de luz brilham mais que 80% de escuridão. E isso é o meu copo meio cheio. Que, aprendi, não vale a pena estar meio vazio.

E tudo isto, da Lua e do brilho e da escuridão, pode ser como o vinho e o café. Metáfora ou não.

Tal como as pessoas. As que estão, as que não estão, as que vão estando, as que vão voltando. Todas, seja qual for a percentagem de brilho que trazem, mantêm sempre o meu copo meio cheio. E fazem-me reflectir a sua luz.

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A ti, Alexandre

A ti não brindo com vinho. A ti, “Alex, Sumol Laranja”. Sempre. Porque o vinho, lá está, não é para estas coisas que fazem doer.

Desculpa se continuo a não conseguir olhar para as tuas fotos. Desculpa se continuo a evitar olhar-te nos olhos quando passo no corredor onde estão as fotos de família, a partir dos 4 anos da Avó Di, onde está o casamento da Avó Dau e do Avô Salvador (que tu não conheceste, mas de quem eu me lembro e guardo com carinho apesar de ter tido pouco tempo a companhia dele). Com fotos do casamento dos teus pais. Da tua irmã. Com as tuas fotos de bebé, que sempre lá estiveram, não são de agora, tuas e da Pi.

Desculpa se não consigo falar directamente com a tua mãe. E se não abraço mais o teu pai. Mas falo com a tua irmã. E falei. E perguntei. E li o teu Processo. Que merda de Processo, devo dizer-te. Que merda que te fizeram, Alexandre! Que merda que nos fizeram contigo.

Tenho saudades tuas, sabes? E sim, continuei a olhar para o portão a tarde toda à tua espera. E tu não chegaste. E enquanto estiver aqui, sempre que oiço a campainha tocar, sempre que baterem ao portão, vou ficar na expectativa. E continuo com saudades tuas. Nunca o disse a ninguém. Mas tenho. Muitas. Talvez, talvez não, de certeza por isso ontem não consegui dormir.

E claro que ao almoço tinha que brindar a ti, em silêncio, para mim. Porque, cá em tua casa, esta vai ser sempre a tua casa, nunca falta o Sumol Laranja. E…Alex, Sumol Laranja. És tu. Sempre.

{6 Meses e 16 Dias}

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Dos dias “assim”

Dos dias que moem. Sem ansiedades, pelo menos não declaradas, talvez com antecipações para o dia de amanhã.
Dos dias que, depois de tantos dias de sorrisos e boa disposição, apenas apetece chorar sem motivo, de impaciência talvez, de incerteza, de dores antecipadas.

Porque amanhã, 6 meses e 16 dias depois, vai ser um dia de dores. Vai ser dia de visitar aquele lugar em Mafra onde há 6 meses e 16 dias se deixou de viver, se passou a sobreviver. Um dia de cada vez. A casa dos meus tios. Onde sei que vou estar, como desde o primeiro dia, a olhar para o portão à espera de ver o meu primo chegar com aquele sorriso de miúdo, de orelha a orelha, e a dizer “foi só uma brincadeira”. E era aí que me levantava e ia ter com ele e lhe batia e chamava estúpido por ser uma brincadeira de tão mau gosto que se arrasta há 6 meses e 16 dias. Mas o portão, sempre que abrir, não vai trazer esse sorriso de miúdo, de orelha a orelha. Vai trazer outros, de certeza, que se vão juntar de surpresa para acompanhar a minha tia no seu primeiro aniversário sem o filho. O outro sorriso, o de orelha a orelha, o de miúdo, o do meu primo, esse, já sabemos, não voltará a passar o portão. E eu não vou poder chamar-lhe estúpido e bater-lhe pela brincadeira de mau gosto. Porque não é brincadeira nenhuma, apesar de ser de extremo e profundo mau gosto.

Assim como é de extremo e profundo mau gosto elevar a herói e aplaudir aquele Palito que assassinou duas mulheres e tentou, ainda que sem sucesso, assassinar outras duas, uma delas a própria filha. Não, não é um herói porque se conseguiu esconder da polícia durante tanto tempo. Menos herói é por ser um assassino. E a quem aplaude este Palito só posso mesmo desejar que nunca passem pela experiência de lhes terem assassinado alguém.

Ainda dói, dizer isto assim. Assassinado. Assassinado. Assassinado. Porque o meu primo, digo-o desde o primeiro momento, não morreu. Foi assassinado. E dizer isto dói. Tanto. Não só cá dentro, chega a doer por fora.
E não adianta repeti-lo vezes sem conta. Porque não é por repeti-lo que vai doer menos. Aqui não se cria calo. Não se suaviza. Assassinado. É um adjectivo demasiado violento. Dizê-lo então é uma atrocidade. A primeira vez que o disse, quando soube, quando passei a mensagem, foi quando o estalo foi maior. Foi quando o estalo de realidade foi mais violento. Porque dizer que o meu primo morreu seria tão menos doloroso porque morrer todos morremos. Mas assassinado. Assassinado. Assassinado. Nem todos somos assassinados. Assassinado é como ser roubado. Roubado de uma vida inteira que se tem pela frente. Terem-nos assassinado alguém é terem-nos roubado uma parte de nós. Daqueles roubos em que é impossível a recuperação dos bens roubados. E não existem palavras para descrever o que se sente. Sente-se e pronto. Pronto, não. Há que lidar com isso. Não sei, ao fim de 6 meses e 16 dias, como se lida com isso ainda. Não sei se algum dia saberei. Não sei como lidam os meus tios. Como lida a minha prima. Não sei. E egoisticamente espero nunca vir a saber. Porque sei que não sei como eu lido. Talvez vá lidando, com dias melhores, outros menos bons. Porque não quero chamá-los de dias maus. Esses são, sem dúvida, os dos meus tios. Os da minha prima a quem o irmão foi declarado morto aos seus pés.

Não, não quero chamar de dias maus aos dias menos bons que vou tendo, seja em que aspecto for. Porque sei que há quem esteja pior que eu, que tenha dores maiores que as minhas. E que eu adorava poder suavizar, atenuar, ou até curar. Mas não posso. Por isso amanhã lá vou estar. No aniversário da minha tia. O primeiro sem o filho. Que lhe foi roubado por um não-herói que não merece aplausos como esse Palito também não merece.

Vou lá estar, com o meu melhor sorriso. Sincero porque gosto de sorrir para quem precisa de sorrisos. E de lágrimas para os meus tios e para a minha prima já chega. Sorriso que não de orelha a orelha, mas com braços abertos para os acolher, a todos, porque preciso deles e eles de mim e nós de todos os que nos querem bem.

Por isso amanhã lá estou. Porque sim. Porque quero há muito tempo lá voltar. E já devia ter voltado. Volto para o aniversário, o primeiro, de uma mãe a quem roubaram o filho.

E os olhos, os meus, esses, vão estar fixados ao portão. À espera, como desde o primeiro dia, daquele sorriso de orelha a orelha, sorriso de miúdo. Sorriso que nunca mais irá atravessar aquele portão.

Não. Amanhã não vai ser um dia bom. Vai ser apenas menos bom. Mais um dia depois do outro. Mais um dia, 6 meses e 16 dias depois.

Cheio, intenso e sem açúcar

Referia-me assim ao café hoje de manhã. Que é assim que o tomo, sempre, que é assim que deve ser porque para ser alguma coisa que seja em grande, que seja forte, que seja puro.

Aplica-se a tanto mais do que apenas café. Até ao vinho, por exemplo. E tanto o café como o vinho dos últimos dias de constância na minha cabeça não passam de meras metáforas para realidades que estão do lado de fora e que apenas como metáforas consigo partilhar.

Sim, gosto muito de café. Sim, estou a gostar do vinho. Mas, lá está, sem aditivos, puros, em quantidade e em qualidade. Tudo. Tudo, como todos os dias atrás de dias. Experiências atrás de experiências. Assim, as emoções, as sensações, boas ou más, mas sempre grandes, fortes e puras. Porque os aditivos, como o açúcar no café, tiram o verdadeiro sabor das coisas, seja ele demasiado amargo, ou com um travo já de si doce. E a medida sempre alta, porque para ser que seja em grande. E a qualidade, sempre a mais intensa, mais forte, mas nunca queimada. Porque se é para sentir, então que me percorra cada poro, cada camada de pele.

E porque também isto é estar viva. E é querer viver. A vida. Assim, cheia, intensa e sem açúcar.

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“Born bad…is such a sin!”

…ou quando o título do post não tem nada a ver com ter ou não nascido bad e sim com o filme de esta noite. Que me apanhou de surpresa por querer, há tanto tempo, revê-lo e quando menos o esperava o encontro ao chegar a casa depois de um dia estranho, ansioso, dorido, abanado.

Saber de manhã, ou pelo menos à hora que para mim ainda é manhã, que alguém de quem gosto muito se despistou com o carro e fez um pião de 360 graus. Saber que está, ainda, e estará mais uns dias no hospital. Nada de grave, felizmente. Diz ela que sim, está bem, mas mesmo assim…abanou-me. Abalou-me. Diz ela também que a vida é muito frágil, estranha e breve, e é, claro que é e sei tão bem que é. E doeu ler a notícia. Mesmo sabendo que está bem, tantas memórias me vieram à flor da pele. Sim, Pê, estás bem, felizmente! E espero que os 360 graus do pião sejam também 360 graus nessa cama de hospital, porque nem sempre uma viragem de 180 é positiva. Prefiro-te a virar a 360 e ver-te voltar ao que eras antes do pião.

…mexeu cá dentro. Porra, mexeu tanto. Por não esperar, por não saber o que pensar, mesmo que lendo repetidamente “eu estou bem”. Mexeu, fez-me viajar no tempo, 6 meses e 12 dias. Fez-me pensar “merda! e se…?!”. Não se aplica o “e se”, mas mexeu. Remexeu. Remoeu. Pê de Põe-te Boa, já sabes. Pê de não vais ficar aí muito tempo, vais estar apenas por Pê de Precaução, tenho a certeza. E quando saíres vamos comer o nosso 100, beber o nosso café, falar, falar, falar, falar! Mas amanhã vou, tenho que ir, dar-te um abraço. Não posso não o fazer. Não posso perder tempo, já o tenho dito, não tenho tempo para perder tempo e não posso perder tempo não estando com as Pê de Pessoas que gosto tanto.

Dia tão estranho. Mistura de sentimentos. Mistura de situações. Sim, misturei o não misturável. Sim, sei que o fiz desde o primeiro momento mas não me consegui descolar da mistura porque à flor da pele ainda cá está tudo. E a ansiedade instalou-se e minou-me como sempre faz. Por vezes aparece de mansinho, outras aparece como um estalo inesperado. Hoje não percebi como foi mas instalou-se. Cortou-me o ar, fez-me tremer. Fez-me pensar “e se…?” e eu detesto pensar “e se…?” porque e se não?
Dizem, digo também, que a ansiedade é pensar no que ainda não aconteceu. Pensei, sim, no que poderia ter acontecido. E vi e revi na minha cabeça um filme que não gosto, não gostei, nunca irei gostar. E revivi outro filme. E doeu. E moeu.

O dia arrastou-se. Literalmente. Arrastou-se ao ritmo dos minutos lentos que demoram a passar. Arrastou-se até começar a reagir. Mesmo depois de muita música para queimar tempo, mesmo depois de viagens à memory lane, viagens das boas, daquelas viagens a memórias guardadas com carinho por serem boas, muito boas, realmente muito boas. Daquelas de arrepiar a pele, de acelerar a respiração. De querer viver, novamente, o aqui e agora. Mesmo sabendo que não, não vai haver esse aqui e agora.

Arrastou-se o dia com tanto para fazer e nada, praticamente nada, feito. Uma luta por dentro, como é tantas vezes, como custa tantas vezes.

Obrigar-me a sair depois do jantar para um olá surpresa num aniversário surpresa, não foi fácil. Venham daí as drogas, pensei. Claro que sim, a ansiedade só lá vai com as drogas e esta semana já vai na segunda vez que recorro a elas, quando ao fim de 20 anos já deveria saber lidar com esta coisa que não é uma coisa mas sim um bicho muito feio e filho da mãe. Mas saí. E pensei bolas, quero viver e viver também é isto, é sair de casa depois do jantar só para ir dar um beijinho surpresa num aniversário surpresa, estar um bocadinho, conversar um pouco e voltar para casa. Sim, viver também é isto. Aliás, viver é isto, não é arrastar um dia, minuto a minuto, só porque o tempo tem que passar e não podemos fazer nada contra isso. Sim, viver é muito mais do que ver os minutos a avançar no relógio. Viver também é o arrepio na pele provocado pelas memórias. Também é sair para fazer uma surpresa. Também é levar um abanão porque alguém rodou a 360 graus. Viver é tão mais isto, caramba…

…e chegar a casa e ser surpreendida por um filme. Nada mais do que um filme, que finalmente me acalmou a ansiedade. Um filme que há tanto tempo queria rever, que apanhei já quase a meio mas que vou rever novamente amanhã. Ou depois.

Um filme violentíssimo, muito, mas ao mesmo tempo uma história de amor. Disfuncionais, os protagonistas desta história de amor. De amor e mortes, muitas. Sem sentido, claro, como todas. Mas de amor. Sem dúvida. E retenho a frase que diz tudo: “Only love can kill the demon. Hold that thought.”
E é isto. Mesmo. Sem mais. Assim, tal e qual. Só o Amor pode matar o demónio. Seja esse demónio o que for, mesmo que seja apenas e só ansiedade. E o Amor, o Amor, esse, vem em tantas formas.

E ficam as memórias, prevalecem as boas, claro que sim, as que fazem, ainda hoje, tantos anos depois, arrepiar a pele e acelerar a respiração.

…e a ansiedade que acalma e aparenta estar longe daqui…

……mas continuo sem ver a Lua, sem ir ao terraço, sem beber vinho, sem ter cafezinhos, sem criar novas memórias. E isso, tudo isso, também é viver. E o que eu quero, mesmo, é viver. Porque, como diz a Pê, a vida é frágil, estranha e breve.

Para ti, Pê.

Papoilas. Ou manchas de vermelho paixão.

Bora coser? Bora!

Coseu-se e acabou-se. E agora, e agora? E agora nada porque não há sono, não há ninguém em casa que não eu e a gata, não há conversa e converseta, não há vinho nem ginja porque beber sozinha não tem piada, não há Lua nem estrelas, só nuvens. E agora? Agora nada porque há uma vontade doida de ver a Lua, de subir ao terraço, de estar, de ser, de aqui e agora.

Seja lá isto tudo o que for.

Dos cafés e do vinho

Nada acontece por acaso e não é por acaso que os cafés e o vinho se misturam por aqui. Porque faz sentido que se misturem, mesmo que misturas destas possam ser pouco recomendáveis.

Há cafezinhos que volta e meia se repetem, com a importância que um café tem. As borboletas na barriga não passam de moínhos de vento e a euforia do início abrandou para a quase rotina de um café só porque sim, porque estamos em caminho.

E depois há o vinho. Que há tanto tempo me apetecia, mesmo não bebendo, não sabendo beber, nunca tendo bebido vinho na vida. Ou tendo bebibo apenas para provar, para lhe sentir o sabor uma vez que fosse.

Mas há muito tempo que me apetece, tanto, um copo de vinho. Só porque sim, porque a simples imagem de estar com um copo de vinho na mão me relaxa, e o que eu preciso de relaxar! E desanuviar. E simplesmente estar e saborear.
Estar no aqui e no agora. E o que é aqui e agora é o que é. O resto? O resto vem depois, se tiver que vir, o que tiver que vir. Porque não tem que vir, não tem que ser. Interessa apenas o aqui e agora.

E ontem. Ontem um copo de vinho ao jantar, ou foram dois? Ou um com acrescento. E duas ginjinhas. Ou foram 3? Aqui não me recordo, mas a ginjinha is the new long drink. De tanto tempo que demorou a ser bebida. Como o vinho. Demorado. Degustado. Apreciado. A acompanhar o jantar, mas que não precisava de companhia, bastava o vinho. Não. Não se bebe vinho assim. Acompanha-se, sempre. Porque sim. Porque o vinho não é para ser bebido a sós. Ou é, mas não é.

E o vinho foi tudo o que eu sabia que ia ser. A descontração. A sensação de “finalmente estou solta”. O sorriso parvo sem motivo. Mas convicto. E sincero. E o sorriso a saber-me bem. Como há muito, tanto tempo não sorria. E as risadas. Só porque sim, porque o vinho era bom, a companhia também. A ida ao terraço mas oh bolas começou a chover, já não vamos! Arriscaria a dizer que foi a noite perfeita, ao fim de tanto tempo, a noite perfeita. Porque houve vinho. E não é o vinho o mais importante, mas é. “Dizer isso assim até parece conversa de bêbados.” Parece mas não é e como dizê-lo de outra forma que não assim, o vinho? É dizê-lo como disse ontem, “era mesmo isto que estava a precisar”, o quê, o jantar?, “não, o álcool”. E rir porque na verdade ainda soa pior.

E sim, bebi vinho e soltei uma parte de mim que andava há tanto tempo esquecida, adormecida, e fiquei alegre como só o vinho deixa, e fiquei com o peso do vinho nos joelhos, nos braços, e ri, e conversei, e ouvi, e vi, e deixei-me estar, e deixei-me levar, e deixei-me ir.

E percebi, como já tinha desconfiado com o café, percebi com o vinho que sim, estou viva. E estou de volta. Sou eu novamente, a mesma que lá para os finais dos anos 90, lá para meados de 98 começou a adormecer, a desaparecer, a não existir numa espécie de hibernação que só há pouco, tão pouco tempo terminou.

E caramba, estou viva, estou aqui, estou agora! Com café, com vinho. Com nada disto, com tudo. E sabe tão bem…sabe tão bem saber que sim, que estou de volta, a mesma eu com quem não me cruzava há tanto tempo, que há tanto tempo não reconhecia no espelho.

Para melhor, para pior? Melhor, decididamente melhor. Mais segura, menos ingénua, menos “tonhó”, mais decidida. Com medos e inseguranças e ansiedades, claro, mas acima de tudo sem pressa porque não adianta ter pressa, nada resolve ter pressa e é só o aqui e agora. O que tiver que acontecer é aqui e agora. Porque é só aqui e agora que acontece. Porque ontem já aconteceu e amanhã quem sabe.

Não, não me preocupo com o vinho. Haverá vinho quando tiver que haver. Preocupo-me ainda menos com café. Café bebo-o sempre, todos os dias. Sozinha, acompanhada, a dois, a três, a tantos. Os cafés que forem. E entre vinho e café, prefiro, obviamente, o vinho.

Sejam lá o café e o vinho aquilo que forem para além de simples café {cheio, forte, sem açúcar} ou vinho {tinto, apetece-me tanto tinto, ou branco/verde quando o tempo voltar a aquecer}.

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