Apocalypse Now…?
Segunda feira, 28 de Abril de 2025., 16h00…
Sem electricidade, telefone e Internet desde as 11h30, mais ou menos.
Começou por ser “só” uma falha de electricidade na clínica de Fisioterapia. Depois passou a ser ali e provavelmente no prédio do lado. Depois já era, afinal, na rua toda. Na praça. Afinal era geral.
Rapidamente se percebeu que o geral não ficava só por ali. Não era só na cidade. Ou no concelho. Era um apagão aparentemente nacional. E pouco mais se conseguiu saber porque tanto a rede telefónica como a de Internet deixaram de funcionar…
De vez em quando, e sabe-se lá muito bem como, alguém trazia novidades: “começou em França”, “vão demorar 72 horas a repôr tudo”, “vamos deixar de ter água”. E, na minha cabeça, com base em informações que “ouvi dizer”, os filmes de terror apocalíptico começaram a rodar…
Como não? Sem acesso ao mais básico da informação, sem fazer a mais pequena ideia do que aconteceu, do que vai acontecer, do que pode acontecer!, sem conseguir comunicar com ninguém porque, no telemóvel, a indicação de “Sem serviço” insiste em ocupar o lugar do nome da minha rede fornecedora de serviço telefónico e Internet…
Sabendo que o Mundo está um lugar cada vez mais estranho, e até perigoso, esta súbita ausência de normalidade assusta. Na era do imediato, porque está logo tudo já ali à mão num qualquer telemóvel, a impossibilidade de aceder à informação para se perceber o que se passa assusta.
Já não sabemos viver assim. Estamos já demasiado formatados e habituados a só não sabermos se não quisermos. A informação, toda a informação!, à distância de um clique envolve-nos numa bolha de segurança, numa zona de conforto de que não abrimos mão. Mesmo que inconscientemente. Já nem nos apercebemos de que estamos constantemente a ser bombardeados com tanta informação, muita dela sem qualquer interesse ou utilidade, outra tanta falsa ou apenas incorrecta, que fica muitas vezes difícil de reconhecer o que realmente é verdadeiro, necessário, útil.
E hoje, cinco horas depois de nos privarem do acesso à informação de que, neste momento, precisamos, há tantas perguntas que não temos a quem fazer, tantas dúvidas que não serão esclarecidas no imediato a que nos habituámos, tantos medos e receios que guardamos em silêncio…
Quando falamos em “apagão”, rapidamente somos transportados para dois cenários reais que ainda existem na memória de uns quantos: a cegonha há mais de 20 anos e a rede eléctrica de França que alimenta a rede eléctrica em Portugal há 3 anos. E pensamos em tempo de resolução à altura de cada evento e as proporções de cada um.
No caso da cegonha, foi uma noite inteira de Portugal às escuras. Na manhã seguinte já o fornecimento eléctrico estava reposto. A Internet era ainda muito incipiente em Portugal ou praticamente inexistente. Redes sociais como as conhecemos hoje não eram mais do que uma mera ideia futurista. Portanto, não havia conversas com ninguém que se encontrava nos antípodas para discutir o assunto do momento: o facto de não haver luz. Em lado nenhum.
Quando a rede eléctrica em Portugal deixou, por breves instantes, de ser alimentada pela rede eléctrica francesa por ter havido uma qualquer avaria, estávamos no Verão. Mais uma vez o país estava apagado, mas tanta gente nem se apercebeu. Sábado e Verão combinam perfeitamente com tarde de praia. Entre grande parte do país sem luz daqui até França e as ondas refrescantes numa praia qualquer, ganhou a praia, claro. Mas, apesar da extensa área geográfica afectada, a resolução foi rápida e em 3 horas já era possível ver que, por todo o lado, a electricidade estava de volta. E, nesta tarde de um qualquer sábado de Agosto há 3 anos, as redes sociais foram acompanhando passo a passo o desenrolar da avaria desde o primeiro “faltou a luz?” até ao último empolgado”voltou!”…
Costa da Caparica confirmava com Oeiras que também não tinha luz enquanto Algés e Vila Nova de Gaia conversavam sobre o mesmo. E, pouco mais do que 3 horas depois de Portugal, Espanha, França se apagarem sem nunca se perder a rede de Internet, a normalidade voltou.
22h34m
Ainda sem electricidade, telefone e Internet, a esta lista de ausentes junta-se a água que já não corre nas torneiras. Lá fora, durante algum tempo, um carro estacionado deu algum conforto a toda uma rua apagada mantendo os faróis ligados. Até se ir embora, parecia quase uma noite normal. Depois…depois deu para perceber, ou relembrar!, que a noite é, de facto, um lugar muito escuro. A Lua Nova também não ajuda a confortar quem, como eu, não se sente confortável com a escuridão.
De repente, uma SMS é recebida. O nome da rede já se apresenta no canto superior esquerdo do meu telemóvel, o que me permite alguma comunicação. A SMS? Da Protecção Civil. A dar conta de que a electricidade será reposta gradualmente e apelar à serenidade. A verdade é que, mesmo não resolvendo nada no imediato, esta mensagem faz-nos sentir acompanhados. Quase aconchegados.
A escuridão lá fora, acompanhada de um silêncio pouco habitual apenas cortado de vez em quando por um qualquer carro que passe na estrada, é desconfortável. Muito desconfortável… Felizmente, não é uma longa noite de Inverno. Não está frio. O Sol pôs-se depois das 20h30. E, com sorte, amanhã já teremos luz… Agora? É preciso descansar. Dormir. E, acima de tudo, não pensar nos filmes de terror apocalíptico que rodam na minha cabeça…