Daily Archives: 23/07/2016

{“há pessoas que estão pior do que tu”}

Dizer a alguém, que está a passar por um momento menos bom, que “há pessoas que estão pior que tu” , pode ser bem intencionado. Não duvido que seja na grande parte das vezes.
Não deixa, ainda assim, de ser das piores coisas que se podem dizer. Dizer a alguém, que está na merda, que “há pessoas que estão pior que tu”, é desvalorizar o sofrimento do outro, é pintá-lo como egoísta que só pensa nas próprias dores quando no mundo lá fora há tragédias tão maiores todos os dias (que as há), é simplesmente anular o outro e o seu direito a sentir e a gerir da melhor maneira que pode e/ou sabe o que sente e como sente.

Dizer a alguém, que não consegue a determinado momento reagir da forma que todos acham que deve reagir, que “há pessoas que estão pior que tu, e isso já passou e tens que dar a volta por cima” é uma tentativa de apagar pedaços da história individual de cada um, como se não tivessem existido, como se não tivessem acontecido, como se não fizessem parte do processo de crescimento de cada um.

Dizer a alguém, que não esquece por muito que lute para não se lembrar, que “há pessoas que estão pior do que tu” é exactamente o mesmo que dizerem, como há dois anos me disseram, que “se não aconteceu não é para ser falado”.

Quando alguém está a passar por um momento menos bom, acreditem: não procuram que lhe digam frases feitas nem bonitas. Não procuram que lhe digam absolutamente nada. Procuram, sim, quem os oiça. Sem julgamentos, sem cobranças, sem respostas prontas em forma de clichés. Procuram simplesmente quem lhes permita ser, estar e sentir. Procuram, acima de tudo, espaço para se isolarem se assim o quiserem, um ombro para chorar se assim o entenderem, um abraço para se fortalecerem se assim o precisarem, e silêncio para falarem se assim o fizerem.

Não. Dizer a alguém que está na merda que “há pessoas que estão pior que tu” não é ajudar. É exactamente o oposto.

Se querem realmente ajudar alguém que não está bem, não digam nada. Ou digam apenas “estou aqui se me quiseres aqui”, e estejam lá realmente. Só assim conseguem que o outro, o tal que está na merda, que chora, que tenta por todos os meios atenuar a dor que vocês não vêm mas que existe, só assim conseguem que o outro sinta que, afinal, há quem respeite o seu sofrimento, a sua dor. Mesmo que não a entenda. Porque não tem que entender. Apenas respeitar.

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