Chega finalmente ao fim o ano mais estranho de sempre. Não posso, no entanto, dizer que foi um ano mau para mim. Se olhar para trás, e nem tão longe assim, tive anos piores. Este foi só estranho.
Sei que nem todos podem dizer o mesmo, mas o meu ano não foi de todo mau. Foi o ano em que se percebeu que é possível trabalhar a partir de casa e fazer exactamente o mesmo que no escritório. Ou, a julgar pelas últimas semanas, até mais.
Estar em casa é-me muito confortável. Sinto falta de algumas rotinas e algumas interacções, mas percebi também que passo sem elas. Ganhei rotinas novas, não muito diferentes das outras. Mas, de facto, estar em casa é-me muito confortável. Tive algum receio no início do confinamento, porque preciso da rotina e de algumas interacções, mas cedo percebi que estar sempre em casa era o que acontecia antes quando era patroa de mim própria. A única diferença era ter um horário definido para cumprir, que antes não tinha.
Sei que para algumas pessoas posso ser privilegiada. Mantive o emprego quando tantos o perderam e o trabalho aumentou, tirando no mês de Abril, no pico do confinamento em que tudo parou e isso reflectiu-se profundamente no trabalho. Mas aí chegou o desafio inesperado de trabalhar com Espanha em fuso horário diferente e numa área tão distante da minha. Desafio aceite e superado e que muito gozo me deu.
Depois veio o Verão. Que foi igual aos Verões anteriores: praia e os meus sobrinhos. Daí para cá, pouco ou nada de novo aconteceu. A nova rotina já está profundamente instalada e os dias são sempre iguais.
Foi isso o que mais me custou este ano: os dias sempre iguais. Tão demasiadamente iguais. E a falta das minhas pessoas, embora tenha podido estar com elas uma ou outra vez. Mas faltou-me a possibilidade de poder estar mais. Sem problemas e sem receios.
Mas o princípio do ano ainda foi normal. E foi no princípio do ano que ganhei coragem para deitar cá para fora o que há tanto tempo guardava para mim. E, ao contrário do que estava habituada, desta vez nada mudou. Nem tinha que mudar. Mas experiências anteriores diziam-me o contrário. Hoje não me arrependo nem um bocadinho daquela sexta feira à noite em que me expus. E dou graças por tê-lo feito quando fiz. Porque um mês e meio depois tudo no mundo mudou e veio o distanciamento imposto. Não teria conseguido guardar comigo tudo o que trazia, mas a ter que me expôr mais tarde não teria a conversa que tive em Fevereiro.
Sim, foi um ano estranho. Difícil. Mas estupidamente confortável. Apesar de tudo. Agora que está no fim só posso desejar que o próximo seja um bocadinho melhor, mesmo sabendo que ainda vai ser um longo ano de distanciamento imposto. Se não puder ser melhor, que seja igual e já não é mau.
Agora? É descansar e ter uma passagem de ano como nunca tive: na cama e provavelmente a dormir.
Amanhã começa um novo ciclo. E será melhor, como todos os dias.