Quanto tempo pode demorar, cá em casa, até se iniciar uma conversa séria previamente anunciada? Muito. Demasiado. Porque, em vez de ser chamada para dar início à conversa que eu mesma anunciei, fui trocada pelas novelas da noite de ontem…
Mas hoje, ao final da tarde na esplanada do costume, ganhei coragem e puxei a conversa. Não iria conseguir fazê-lo em casa, onde cada vez me sinto mais presa.
E disse: estou cansada, estou completamente sozinha, preciso de ajuda porque não estou bem.
Falámos desta coisa que me apanhou na curva e que é a responsável pelo meu actual estado altamente depressivo (e que não só me preocupa como também me assusta). E tudo por estar completamente sozinha. E por não saber lidar com a solidão e muito menos com esta frustração que me consome.
E não me digam que não estou sozinha, porque estou. O telefone não toca. Na esplanada é mesa para um. E nem o médico respondeu ao email que enviei dia 17.
Não sei lidar com isto tudo sozinha. Não consigo. E preciso de ajuda, mas não me apetece ir novamente à urgência de psiquiatria…
A solidão dói. A solidão, em casos extremos, mata. E a mim mata-me todos os dias mais um bocadinho…
Não posso ser injusta. Quando digo que estou completamente sozinha, não estou a ser justa. Porque há 3 pessoas que tenho que referir:
– a minha mãe, claro, que tem feito o que pode e o que sabe para aguentarmos as duas todo este processo que se arrasta no tempo e todas as dificuldades e limitações que me têm chegado e que, sei-o, a afectam a ela também. Que me acompanha a todas as consultas e exames. Que, acima de tudo, aguenta o meu mau humor nos dias mais difíceis, que faz de tudo para que não me falte aquilo que eu não consigo fazer, que me serve de apoio quando só a bengala já não me é suficiente e vai comigo para o Yoga e fica lá à espera, às vezes duas horas, para eu conseguir voltar para casa…
– o Polvinho que me acompanha há pouco mais de um ano, quando tudo ainda era só um Burnout que rapidamente passou a uma suspeita e que desde o primeiro momento me disse que caminhamos juntos de mão dada e que, se o caminho se tornar mais difícil, me leva ao colo. Não, não me esqueço destas palavras que ninguém, nem ele!, imagina a importância que tiveram naquele momento em que as dificuldades e limitações ainda não eram as que são hoje mas que já me davam momentos grandes de desânimo e frustração. E ainda só estávamos no campo da suspeita e à espera de marcação de consulta… Um Polvinho que não desiste de mim, que já fez questão de dizer que não pretende ir a lado nenhum quando eu mesma lhe disse que era tudo demasiado pesado e que entenderia se ele se afastasse. Todos os dias, a distância de um clique, há mais de um ano, há um Polvinho que não desiste de uma Corujinha mesmo nos dias menos bons como têm sido os últimos…
– o P de Presente, que me abanou e trouxe de volta à Terra e, quase de imediato, se fez P de Presença. Que veio até cá uma tarde. Para que eu pudesse sair de casa, ir beber um café e ter uma conversa normal, nem que fosse sobre o tempo!, e que nessa tarde tinha uma Nortada intensa e desagradável. O mesmo P de Presente, P de Presença que me levou a ver o pôr do Sol na baía como há tanto tempo eu queria, onde jantámos, conversámos e quase nos esquecemos desta coisa que me apanhou na curva. Que agora está de férias, mas que acredito que voltará a ser P de Presença quando regressar. E que percebeu, logo naquela tarde em que fomos beber café, que eu trago muita raiva em mim e que um apoio psicológico seria muito importante para mim neste momento momento.
São estas as três pessoas que me fazem sentir um bocadinho menos sozinha. Mas, tirando estas três pessoas, cada uma num papel/estatuto diferente, faltam-me os outros. Os que enviam mensagem no início de Maio e dizem “estou de férias, ligo-te e vamos beber um café no fim de semana”, mas o telefone nunca tocou e o café não aconteceu. Aqueles que dizem “esta semana vai acontecer, vamos beber um café” e desaparecem no éter. Aqueles que têm o meu contacto, seja ele de telefone, de Facebook ou Instagram. Que podem rapidamente chegar até mim sem terem que vir até cá se estiverem longe…
Na conversa desta tarde com a minha mãe foi dito o que ambas sabemos ser verdade: as pessoas, quando há uma doença pelo meio, ficam sem saber o que dizer. Acredito nisso e aceito. Mas basta que me digam Olá. E vão perceber que eu continuo a ser EU. Porque, e não me canso de dizer isto, eu TENHO uma doença, mas eu NÃO SOU a doença. Ainda por cima uma doença não transmissível, que não se pega a ninguém! As pessoas podem ficar sem saber o que dizer, mas não precisam de, simplesmente, desaparecer. E foi isso que aconteceu.
Por isso, sim!, digo que estou completamente sozinha, tirando as três excepções que já referi. E a solidão é um bicho que nos consome. E a mim está a consumir demasiado. Porque eu preciso de pessoas. De ver pessoas. Estar com pessoas. Falar com pessoas. E não estou com ninguém…
Sinto-me demasiado presa em casa. E, quando saio, é para ir a Almada à fisioterapia, ou ao Hospital para análises ou exames, ou ao CDP para consulta e medicação para a terapêutica preventiva. Curiosamente, há poucos dias dei por mim a dizer que estava cansada e farta de não sair deste rectângulo. Hoje, ao falar sobre isto com a minha mãe, percebi que não se trata de um rectângulo…casa, Almada, Hospital e CDP cruzam-se…portanto, eu não saio desta cruz!
Há um ano atrás eu ainda dizia “eu vou aí ter para um café”, fosse em Almada ou fosse em Lisboa. Porque, há um ano atrás, ainda podia. Ainda conseguia. Ainda ia sozinha para todo o lado e sem dificuldades ou limitações. Simplesmente ia. Ponto. Hoje? Não o faço. Não tenho confiança suficiente para o fazer. Ir sozinha de autocarro para Lisboa? Não me sinto segura para ir sozinha. Por isso já não digo a ninguém “eu vou aí”.
É! É um sentimento de frustração muito grande e de solidão ainda maior. E de revolta. E de negação. É querer voltar a ser quem era, como era e saber que isso nunca mais vai acontecer… É estar revoltada com tudo isto, mas acima de tudo estar revoltada e zangada comigo mesma! Porque eu não procurei isto, eu não pedi isto. E continuar há meses à espera de alguma resposta do médico gera uma enorme ansiedade que também não me faz bem e me faz sentir ainda mais sozinha, para não dizer logo abandonada…
Também é querer, e precisar de!, chorar e não conseguir. Mas, acima de tudo, é a solidão, os dias vazios, ver o tempo passar, não fazer nada para além da fisioterapia 3 vezes por semana e o Yoga 2 vezes por semana. É o querer aproveitar o calor e a proximidade para fazer praia e não poder porque o calor é, nesta doença, o pior inimigo. É querer fazer caminhadas até ao paredão para ver o Mar e saber que, se o fizer, demoro 3 horas e no dia seguinte não consigo andar…
Como disse à minha mãe esta tarde, isto que me apanhou na curva é uma merda! E é. E eu estou farta. E preciso de ajuda para aprender a lidar com tudo isto, que é demasiado! E preciso de ajuda hoje, não só no dia 17 de Julho na primeira consulta com o psicólogo do Hospital. E sim, já estive mais longe de voltar à urgência de psiquiatria…
Eu não quero nada disto para mim. O que eu quero é deixar de me sentir tão sozinha. E o que eu preciso é de ajuda…
Deixo aqui este desabafo hoje. Sei que terei dias melhores. Mas a solidão está a consumir-me todos os dias mais um bocadinho. E a matar-me todos os dias mais um bocadinho. Porque a solidão dói. E a solidão mata. E eu não quero continuar completamente sozinha como me sinto agora………