Category Archives: {#Capítulo8_2017}

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Sonhar uma primeira gravidez é perturbador. Sonhei-a pela primeira vez aos 16 anos culminando num parto peculiar. Nunca mais me esqueci desse sonho, de todos os pormenores desde o sítio onde estava aos cheiro do parto. Não sei se um parto tem algum cheiro específico, aquele teve apesar de se tratar de um sonho e ainda hoje o recordo.

Sonhar uma segunda gravidez depois do que foi a primeira, tão curta e ao mesmo tempo eterna, tão minha e apesar disso tão inválida para tanta gente, sonhar uma segunda gravidez é doloroso. Perturbador. Rouba-me o ar. Gela-me o peito. Molha-me os olhos. Faz-me querer soltar a voz e perguntar mil vezes porquê este sonho. Este sonho agora, depois de 3 anos a tentar deixar ir o que não foi, mas foi. O que foi mas não chegou a ser. O que foi não sendo. O que não sendo foi. Porquê?

Dizem que os sonhos são, muitas vezes, reflexo do que desejamos, muitas vezes de forma não consciente. Se o desejo…? Não sei. Sei, sim, que não desejo repetir 42 dias apenas. Não desejo repetir nada daqueles 42 dias, especialmente os últimos 10. Não desejo repetir os últimos 3 anos. 3 anos e 1 mês hoje. A ironia……

Se me lembro do que sonhei aos 16 anos, também me lembro do que sonhei esta noite. 6 meses de gravidez. Uma barriga que não tive. Redonda. Perfeita. Recordo-me da sensação de lhe tocar. De a afagar. Mais o toque na minha barriga do que o palpar da minha mão. Já senti muitas barrigas, sei o que é sentir de fora. Não aconteceu senti-la de dentro. Tirando esta noite. Esta noite fiquei a saber como é sentir quando tocamos o nosso bebé. Fiquei a saber como reage o nosso corpo. E como reage também o nosso bebé.

É estranho descrever tudo isto. Como se fosse real. Mas a verdade é que tenho saudades da barriga que nunca tive.

Sonhar a segunda gravidez é perturbador, especialmente depois do que foi a primeira. Mas pode ser pacífico se não incluirmos elementos estranhos a essa gravidez. Como, por exemplo, o pai do meu filho que não chegou a ser. A querer fazer-se presente agora, depois de mais de um ano de silêncio absoluto e ausência. Mais preocupado com a minha segunda gravidez por causa do que foi a primeira do que eu que aos 6 meses sabia estar tudo bem. Preocupado em querer saber quem era o pai e porque é que não era ele. Preocupado em querer saber se eu estava bem.

Elemento estranho num sonho já de si perturbador. Porque é isso que somos hoje: dois estranhos com uma gravidez em comum. E o sonho foi ainda mais perturbador só pela imposta presença de alguém que hoje já não conheço.

Tenho saudades da barriga que não tive. Mas que hoje, de alguma forma, pude sentir no esplendor dos meus 6 meses de gravidez. Mesmo que nunca venha a passar de um sonho, hoje senti a minha barriga. Por fora. É, mais importante, por dentro.

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………quando é que desligam o carrossel comboio fantasma montanha russa que não precisa de moedas………?

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Equilíbrio. Tentativa de.

Equilíbrio. Falta de.

E olho para ti e vejo-te crescer e tenho que constante lembrar-me: não és meu. Não és O Meu.

Um dia serei melhor. Até lá a pele continua a queimar, eu continuo a tentar o equilíbrio.

Vontade de riscar a pele. Vontade de rasgar a minha própria pele. Aquela que é por dentro que me queima e me recorda que não conheço o equilíbrio. Provavelmente nunca irei conhecer.

E não há quem me agarre as minhas mãos. E não há quem me pare. E não há quem me apague o que me queima. A minha própria pele.

O grito não sai. Já não sai. Especialmente quando não me levam a sério quando repito tantas vezes qual a solução pacífica para tratar o que está doente. Quando não duvido que essa seria, de todas, a melhor solução para renascer.

Porque o dia a dia do rame-rame com horas marcadas para tudo só faz sentido às pessoas normais. E eu, eu que faço sempre por fugir da norma por me saber diferente mesmo que por vezes quase implore pela norma e por ser igual, eu lá vou indo no rame-rame das pessoas normais, 6h, 6h30, 7h30, 7h50, 9h, 10h30, 12h15, 13h15, 15h20, 18h, 18h30, 19h15, 21h, 22h30, 23h, repete.

…cansada. Acima de tudo de raras vezes ser levada tão a sério quanto precisava. Não preciso que me validem pelo que sou, pelo que faço, pelo que sinto. Preciso que me validem, apenas, o facto de simplesmente existir. Porque tantas vezes, demasiadas…?, chego a duvidar da minha própria existência.

E olho para ti e não és meu. Não és O Meu. Não és parte directa de mim. Não existes. Porque existo eu então?

Um dia serei melhor. Até lá, equilíbrio. Tentativa de. Falta de.

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Nunca mais aprendes, pois não? Nunca mais aprendes que não adianta seguir as regras, porque a cada nova cor uma nova regra. E o Mundo em cor de rosa não resulta.

Por isso cada vez mais te sentes melhor no cinzento, não é?

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O problema é quando as cartas estão viciadas e a casa ganha sempre. É esse o problema de ir a jogo sem truques e apostar sem contagem de baralho, apostar numa combinação que só é possível sem o vício de cartas repetidas. Basta uma carta e o jogo nunca será do apostador, será sempre da casa.

E por isso o lugar mantém-se vazio. Vazio sem presença, mas sem ausência. Sem espera, mas sem desesperança. Sem pressa. Mas sem tempo para perder Tempo.

E tenho que, tenho que, tenho que. Não tenho que nada mais. Nada mais do que posso, do que consigo, do que sei, do que sou. Não tenho que.

Porque ter quer só eu me posso exigir e só posso exigir-me não ter pressa. Um dia serei melhor. Não estarei apenas. Serei.

“De todos, ele é mais parecido contigo” e sei que sim e sei que dói tamanha parecença que a genética ditou num jogo sem batota e onde posso dizer que de alguma forma ganhei mas o jogo não é meu. Nem ele. Repito-o quase desde o primeiro dia, que foi no segundo ou terceiro quando tive que aceitar que não era de facto.

O jogo está viciado. Desde sempre. E o problema é quando as cartas estão viciadas e a casa ganha sempre. E a casa não sou eu.

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Olhar para cima. Encontrar cor.

Azul.

O que traz o azul? Para além do céu e do mar, o que traz o azul?

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Ver as coisas por outra perspectiva. Quando se vê de dentro para fora nem sempre vemos o mesmo que os outros nos vêem.

Preciso de ver de fora para dentro. Ver o que os outros me vêem. Como a tal postura que me falaram hoje de mim.

De fora para dentro. Preciso de ouvir-vos. Talvez assim o que vejo de dentro para fora possa ser (re)constituído, (re)construído, (re)alinhado, (re)lido, (re)aprendido.

Preciso de ouvir-vos. Muito.

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Se cada dia é uma segunda oportunidade, já tive 1100 depois de 18 segundas oportunidades depois de 42.

Desperdicei-as todas. E continuo a desperdiçar.

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Há 3 anos a escrever todos os dias. Porque um dia atrás do outro atrás do um. 1096 posts seguidos. 1097, se contarmos já com este.

Terapia? Exorcismo. Porque há 1096 dias, 1097 se contarmos já com este dia, alguém me disse “reage, porra!”. E eu reagi. De todas as formas que conheço para reagir, escrever é a melhor de todas. Exige de mim mais do que a disciplina de escrever todos os dias, sempre com uma fotografia a acompanhar. Fotografia minha, tirada preferencialmente no mesmo dia mas nem sempre acontece, confesso.

Escrever exige introspecção. Exige ir lá ao fundo, dentro de mim, muito para além da pele que me queima por dentro. E muitas vezes, tantas, o que encontro lá ao fundo, dentro de mim, não é bonito. É dorido. É, muitas vezes, sofrido. É negro, mesmo que já tenha passado a fase das cores. São gritos de quem está em guerra. Não com os outros, não com o mundo, mas consigo mesma. Comigo mesma…

São, tantas vezes, pedidos de ajuda. Tantas vezes dissimulados, camuflados. Outras vezes mais directos da melhor forma que consigo ser directa. Riscos na pele? São pedidos de ajuda. Vozes que me falam? São pedidos de ajuda.

São 3 anos de toda uma nova realidade que começou 18 dias depois de 42. 18 dias demasiado violentos para os recordar, numa explosiva mistura de hormonas, químicos, revolta, raiva, medo, dor, física e daquela que não se vê nem se toca, palavras brutas, silêncios perturbadores. 3 dias sem falar. 3 dias que prometi a mim mesma que não iria repetir e cuja promessa quebrei algures nos últimos meses.

“Reage, porra!”, e eu reagi. E 3 anos depois, 1096 dias depois, 1097 se contarmos já com este, continuo a reagir. Quando tantas vezes, demasiadas vezes, me apetece deixar de reagir e simplesmente deixar-me ir. Ir não sei bem para onde nem para quê. E é nesses momentos dos últimos meses que me faz pegar nas palavras escritas todos os dias. Mesmo que a vontade, o ânimo, seja igual ou menor que zero.

1096 dias seguidos, 1097 se contarmos já com este, tantos dias, tantas palavras, tantos caminhos percorridos.

Já pensei tantas vezes em desistir da palavra escrita. Desta que deixo por aqui gravada no éter. Mas é-me demasiado necessária, ainda, para exorcizar o negrume que ainda carrego comigo.

Não é tristeza. Não é amargura. Não é nada disso. É dor. Apenas dor. Um apenas do peso de uma dor que quero tanto curar. E que me esforço tanto para, primeiro, tratar.

Um dia volto a escrever a cor. As cores. Por agora expulso, tento expulsar, o negrume da dor.

Nem que sejam precisos mais 1096 posts seguidos, 1097 se contarmos já com o que será o equivalente a este, daqui a mais 3 anos.

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Cabeça a mil. 

E a rede de segurança tão pequena e tão nada à mão… 

Cabeça a mil. Ser invencível mesmo que não o seja. 

Cabeça a mil. E os riscos na pele que ninguém vê, que ninguém pergunta. 

Cabeça a mil. 

Mas a máquina de fazer pipocas que se apoderou da cabeça há uns meses, essa máquina ainda se mantém desligada. 

Cabeça a mil. Não no fundo do mar.

Cabeça a mil, a mover-se devagarinho. Mas demasiado acelerada mesmo assim. 

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“Nada mudou, o Sol continua a nascer e a pôr-se todos os dias, não continua?” 

Mudei eu. E não foi para melhor. Mas hei-de mudar novamente. E aí sim, será para melhor do que aquilo que sou hoje. 

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De todas as perguntas que me possam fazer, apenas uma me custa responder. Pode ser uma simples pergunta de circunstância ou uma pergunta de quem quer realmente saber, sem filtros nem floreados. Apercebi-me há pouco tempo, quando hesitei na resposta, que me custa porque me pesa a responsabilidade da resposta. Porque filtros e floreados ou o politicamente correcto de conversas de circunstância já não fazem sentido, já não funcionam comigo. 

Entendo que me perguntem. Não espero que entendam quando respondo. Hesito primeiro, sempre. E acabo por dizê-lo. “Não sei…” Porque não sei como responder por não saber realmente o que responder. Porque não sei, de facto, a resposta a tão simples pergunta. “Como estás?” e a única resposta que encontro é que, de facto, não sei… 

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Fazem-me falta abraços. Afectos. O toque.

Só o toque me diz, me garante, que existo, sou real. Pele com pele. Pele de afectos que acalma a pele que queima por dentro, a minha.

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Para poder olhar em frente por vezes tenho que olhar para trás. Para trás de mim, para trás de tudo. 

Porque é lá atrás que está a resposta ao agora. E enquanto não conseguir olhar nos olhos do que está lá atrás, lá tão atrás, não conseguirei olhar apenas em frente. 

Está lá atrás. Muito, muito mais atrás do que os últimos 3 anos. Um dia aceito e resolvo. Um dia aceito-me. E resolvo-me. 

Não hoje. 

Não agora. 

Não ainda. 

Não já. 

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1 ano, 5 urgências psiquiátricas, 1 psicólogo, 1 psiquiatra, várias ausências que me moem e 365 dias de luta com muitos dias (e noites) de puro pesadelo depois, mantenho: cansam-me as vidas perfeitas. Já não me cansa que me digam que não devo expôr-me como me exponho porque quem o fazia optou pelo silêncio e/ou pela distância e ausência.

Cansa-me, isso sim, a luta constante. Diária. Hora a hora. Minuto a minuto. Cansa-me, isso sim, perceber que um ano depois e ainda continuo ali, no fundo de um poço que nunca pedi para mim. Dizem-me, diz-me ele, que ao fim deste praticamente um ano em que me acompanha semanalmente e duas vezes por semana há 6 meses, que estou melhor. Que fiz progressos. Grandes progressos, diz-me ele. Que estou diferente para melhor. Gostava de acreditar nele. Confio nele, mas não acredito quando me diz que fiz progressos. Porque não o sinto.

Ideação suicida cada vez mais presente. Vontade de auto mutilação cada vez mais intensa. Auto estima cada vez mais inexistente.

Cansa-me este estado. Do qual não sei como sair.

De resto, tudo o que escrevi há um ano podia ter sido escrito hoje. Quem sabe o que escreverei daqui a um ano. Quem sabe se, sequer, escreverei.

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“- Quando morreres, tia, vamos ter contigo ao cemitério. E levamos-te flores. E uma velinha. Boa ideia? Não. Uma velinha não, 2! Não… 5 velinhas. E uma lanterna para a chuva não as apagar. E quando morreres, tia, nós vamos ter muitas saudades tuas.” 

…………e fica a sensação que, aos 4 anos, a memória não dura para sempre. E com o tempo acaba por se apagar. Como as saudades.