Category Archives: {42 dias}

{Fazer de conta}

Fazer de conta. Ando a ficar perita nisto.

Hoje, como há um ano. Uma calma aparente, a camuflar um turbilhão interior.

Hoje, como há um ano, a precisar de um colo, de um abraço forte, de uma mão a segurar a minha.

Hoje, como há um ano, sem chão, sem rumo, sem força.

Hoje, como há um ano, sem sorrisos ao canto da boca nem brilhozinho nos olhos.

Hoje, diferente de há um ano, sei que amanhã vai ser melhor. E que vou continuar a viver e não apenas sobreviver.

De resto, hoje como há um ano.

{a memória de calendário, o meu pior pesadelo…}

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{como desestabilizar em menos de nada}

O dia inteiro a fazer de conta que a data não é importante. Que não é minha. Que não me é, simplesmente. Porque não é.
No meio de uma converseta de parvoeira de fim de feira, de brincadeira, receber como resposta “tu ainda não és mãe. Se um dia fores…”

………respirar fundo, morder o lábio, tentar aliviar o nó na garganta, secar os olhos que de repente ficaram húmidos com a violência do murro no estômago.

Não, ainda não sou mãe. Ou sou não sendo. Ou fui. Não sei.

Sei que não pensei noutra coisa o dia inteiro. Sei que fiz por esquecer. Sei que fiz por não lembrar.

Sei, também, que foi uma resposta inocente. E que, no contexto, fez sentido.

Mas bolas…os murros no estômago doem, cortam o ar, apertam a garganta e humedecem os olhos e fazem o queixo tremer………SavedPicture-201553233012.jpg

{198 depois de 42. Ou as saudades do filho que não tive}

Saudades tuas, muitas. Tantas…

Falo contigo de mim para ti, como se existisses. Como se ainda existisses cá dentro, a crescer, a deixar-me enorme, a deixar-me inchada de Amor por ti.

Falo-te todos os dias. Ouves-me? Sentes-me? Eu não te sinto, já. Na verdade, nunca cheguei a sentir-te realmente. Não houve tempo para isso… Mas senti as mudanças durante aqueles 42 dias que me diziam, mesmo sem te sentir, que crescias dentro de mim.

Hoje sinto a tua falta, como todos os dias desde o primeiro dia que foi o último. Quando deixaste de ser. Porque não podias ser, dizem-me. Mas trago-te comigo, em mim, todos os dias. Mesmo que as lágrimas me visitem amiúde, mesmo que as memórias me doam, trago-te sempre comigo.

Mesmo sabendo que falta pouco menos de 6 semanas para o meu aniversário. O mesmo dia que seria também o teu aniversário, pelas contas do calendário que não chegou a ser. Quando soube de ti, sorri e pensei “nunca mais vou passar um aniversário sozinha”. Não sabia, no entanto, que esse dia nunca chegaria a ser também o teu dia, o nosso dia. Vai continuar a ser só o meu dia, sozinha. Porque por muita gente que esteja comigo nesse dia, vou continuar a estar sem ti.

Dói muito, sabes? Gostava de poder apagar a memória. Para não doer. Para não chorar como agora. Mas, por outro lado, não iria lembrar-me de ti, o meu bebé. O meu filho. Que não chegou a nascer e que, por isso, me faz doer tanto cá dentro.

Tenho saudades tuas. Muitas. Tantas. Não tem explicação esta imensidão de saudades de algo que não chegou a ser. Do meu filho que não chegou a nascer.

Amo-te muito. Quero que o saibas. Nunca o tinha dito, nunca o tinha escrito, nunca quis pronunciar esta frase porque tu não está cá. Porque cheguei a pensar que não tinha tido tempo para me apaixonar por ti. Porque foste-me tão breve. Mas ser-me-ás eterno. Mesmo que não estejas aqui para te sentir dentro de mim, mesmo que não estejas aqui para te ver crescer a partir do dia do meu aniversário. Que seria também o teu. Seria o nosso dia. E seria sempre de festa. Porque tu estarias ali comigo como o meu maior presente. Mas não estás, não estarás…e serás sempre, para sempre, o meu maior ausente.

Amo-te muito. E sei que nunca te irei esquecer, mesmo que me tenhas preenchido apenas por 42 dias…10986922_10152823410243800_8996728826117058606_n (1)

{6 meses}

6 meses hoje.
184 dias.

E não há pormenor que não me lembre desse dia.
E não há dia em que não pense, não sinta, não reviva tudo.

Dói hoje como há 184 dias.

Quanto tempo demora o Tempo a fazer aquilo que o Tempo faz?

{and I always wonder if you still remember, you even think about it…}

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{da saudade}

Basicamente, viaja-se neste autocarro de tempos a tempos.
O bilhete, dizem, é vitalício. A viagem, dizem-me, ameniza com o tempo.

…mas, enquanto não ameniza, dói…10850043_10152670792898800_5697551592358094291_n

E, de repente

é Julho em Dezembro…

{ou de quando nem afundar-me no trabalho desliga a força da memória. E das saudades……}10849990_10152669334213800_2345149332475593410_n (1)

Do vazio. Ainda.

Passam os dias. Faço por não os contar. Deixei de os contar. Até voltar a contá-los novamente. Porque os dias passam mas aquele vazio de nada, vazio de tudo, continua. Uns dias mais esquecido, uns dias mais sentido, uns dias mais recordado.

Tento fugir do mundo à minha volta e do que não posso fugir porque o mundo existe e é mesmo assim. E nunca ninguém disse que o mundo, esse à minha volta, à volta de tanta gente, de toda a gente, nunca ninguém disse que esse mundo era justo. Ou certo, sequer.

E há o vazio. E a ausência. E o que podia ter sido. E não foi. Já não é. Já não está a ser. E quem sabe se algum dia, alguma vez, será de novo. Duvido, como sempre duvidei até ser. Como sempre achei que nunca seria. Até que foi. E de repente, num momento, deixou de ser. Será alguma vez novamente? Será alguma vez? Mesmo que seja, este vazio fica sempre cá. Porque é insubstituível. Porque é um vazio que tem um lugar próprio, só dele. Ou dela. Não sei. Nunca saberei. Mas mesmo não sabendo não deixa de o ser. Ou melhor, deixou de ser para passar a não ser…porque já não é.

E precisamente por já não ser, e por muito que me esforce para avançar, é impossível não pensar. Não imaginar. Não recordar. E é impossível não baixar os olhos novamente e fixar apenas o chão. E ter novamente a visão turva e húmida. Porque o vazio, o peso do vazio, é todos os dias um bocadinho maior. Com o passar do tempo, que não conto mas sei que passa, devia ser mais pequeno. Dizem. Dizem-me. Disseram-me. Mas não é. Não devia ser. Nem devia ser vazio. Mas é. É o que tenho cá dentro. Porque, cá dentro, não há nada. Já não.

Tenho saudades do que já não é. E imagino tantas vezes como seria neste momento se ainda o fosse. E saem-me palavras duras que digo para mim mesma que não podem ser, mas que saem. Porque ainda dói. E saem também palavras doces dirigidas ao que já não existe, ao que já não é. Não faz sentido. Mas faz. Porque, para mim, é como se ainda existisse alguma coisa. Pelo menos por momentos. Até me recordar porque é que ainda dói.

E vai doer até quando…? Não sei. Sei que a memória não se esvai, não se apaga, nunca.

E continuo sem saber o que fazer com tudo o que resta do que não foi. Guardo comigo, mesmo não lhe mexendo, mesmo não revendo, mesmo não querendo olhar. Mas não sei o que fazer com o que resta. Com a única coisa que resta do que não foi. E que eu sempre quis tanto que fosse.

Não sei também se voltará algum dia a ser novamente. Lá está, continuo a duvidar como sempre duvidei até ser. Mas mesmo que um dia seja, mesmo que um dia se repita, há sempre um vazio cá dentro. Do que foi e não chegou a ser.

E não ter onde ir para me sentir mais perto do que não foi. Não ter onde me sentir em paz. Numa espécie de ponto de fuga. Dói também. E isso, também isso, faz parte do vazio do que não foi.

E há tantos outros vazios que não vão ser preenchidos. Porque o que foi já não o é. E sim, ainda dói.tumblr_l9517nt4kj1qdhaljo1_500

{do Tempo que passa}

O Tempo, dizem, dizem-me, é o melhor remédio. Cria distância, apaga dores, atenua saudades até mesmo do que não podia ser. Mas não apaga memórias.

Memórias do que durou pouco tempo mas que foi um longo tempo dentro do que pode ser.

Memórias de cada um dos dias. Todos eles marcados na memória quase como marcados na própria pele. Mas especialmente o último. O pior de todos. Revivo-o todos os dias, mesmo que à distância do Tempo pareça, e esteja, já tão longínquo.

Mas revivo esse dia todos os dias. Porque a memória, seja ela do que senti, do que vivi e especialmente do que vi não se apaga. Nem tão pouco se dilui na névoa do Tempo que passa.

E as saudades, mesmo daquilo que não pode ser, ficam…

E se eu chorar {parte 2}

E se eu chorar, outra vez, ainda, já não te peço que me abraces, nem que me relembres que a Lua olha sempre por mim.

Porque se eu chorar, outra vez, ainda, ninguém o vai saber. Irei chorar em silêncio, sem pedir que me segures nas mãos, ou me digas que estás aqui. Porque é um choro que é só meu agora. Que me pertence apenas a mim. Por todas as dores que ainda sinto. Aquelas que ninguém vê, que não deixam marcas tangíveis, mas que estão cá, em recuperação, a ser tratadas, desinfectadas, desinflamadas, à espera de cicatrização.

São lágrimas que só eu entendo, que já só eu sinto e sei a sua razão. Porque é um processo que é meu, mesmo quando não o é exclusivamente. São lágrimas que me assaltam mais depressa do que esperava que o fizessem. Que aparecem de surpresa, do nada. Do nada? Não. Do tudo. Porque a memória é um tudo e essa não se apaga. E é um tudo doloroso, de tirar o ar, de fazer contorcer de dores que só eu conheço, que só eu entendo, porque são apenas minhas.

Se eu chorar, outra vez, ainda, não me digas, não me digam, nada. Permitam-me ser assim. Sentir assim. Recuperar[-me] assim. Reencontrar-me assim. Porque chorar não resolve nada, não adianta nada, mas é assim que eu reajo, é assim que eu sinto, é assim que eu sou. É assim quem eu sou. Porque a vida não vem com manual de instruções, por muito que tanta gente acredite que sim, que todos devíamos reagir igual.

Se eu chorar, outra vez, ainda, sempre enquanto houver lágrimas para chorar, porque o motivo vai existir sempre, sempre enquanto houver lágrimas para chorar, deixem-me fazê-lo. Porque fico mais leve, mesmo que chorando pareça que bebi demais, me deixe com sentimentalismos e lamechices à flor da pele e uma dor de cabeça de ressaca.

Chorar não apaga o que já foi, que no fundo não foi, o que já foi e deixou de ser, não apaga nada, não traz nada nem ninguém de volta. Não refaz sonhos desfeitos. Não devolve o que nos roubaram. Chorar é apenas o aqui e agora, porque é aqui e agora que a memória me traz à flor da pele todas as dores dos últimos meses.

Se eu chorar, outra vez, ainda, as vezes que tiver que chorar, só preciso que mo permitam. Sem críticas. Sem penas. Sem palavras, até. Porque as lágrimas turvam-me a visão e até os ouvidos podem captar o que não foi dito. Por isso choro sozinha. Em silêncio. Para mim. Mas choro. Outra vez. Ainda. As vezes que tiver que chorar enquanto doer.

E se eu chorar

…se eu chorar não me peças para não o fazer, nem tentes enxugar-me as lágrimas. Nem me digas que chorar faz bem. Claro que faz. Já sei, sabemos, que sim.

Se eu chorar, abraça-me apenas. Sem eu te pedir. Segura-me as mãos, chora comigo. Deixa-me ficar, quieta. Não tens que me dizer nada, ou se quiseres dizer relembra-me apenas que estás aqui.

Se eu chorar? Hei-de chorar tantas vezes ainda. Mas relembra-me que a Lua brilha todas as noites, mesmo quando não a vemos, mesmo quando está como eu, vazia. E a Lua olha por mim, sempre. Assim como eu olho para ela, sempre.

Se eu chorar? Se eu chorar só preciso de saber que, na tua ausência, na vossa ausência, a Lua há-de sempre olhar por mim.

Sou só parva

Anda comigo ver a Lua, que como eu já não está cheia. Mas que brilha lá em cima, ainda tímida, envergonhada.

E dá-me a mão. E diz-me que também isto vai passar. Que ainda é cedo, mas vai passar. E que não, não “sou só parva”.

Encosta-te a mim, quando eu deitar a cabeça no teu ombro e te disser baixinho que dói cá dentro. Uma dor que vem do vazio que é visível, uma dor que é indizível.

E quando te disser que tenho saudades, saudades do que já não é, saudades do que já não tenho, saudades do que pouco ou nada tive e que foi tanto e foi tudo, quando te disser que tenho saudades abraça-me com força. E diz-me, mesmo que num sussurro, que amanhã vai ser melhor, mesmo que a saudade, essa, dure para sempre e doa todos os dias.

Ou então não digas nada. Não me abraces. Mas segura-me na mão, nas duas. Com força. Aquela que preciso para continuar a sobreviver.

E deixa-te ficar assim. Comigo. Porque sim, estou carente. E porque sim, preciso que me dês a mão.

“Não digas nada, dá-me só a mão. Palavra de honra que não é preciso dizer nada, a mão chega. Parece-te estranho que a mão chegue, não é, mas chega. Se calhar sou uma pessoa carente. Se calhar nem sequer sou carente, sou só parvo.”

António Lobo Antunes

Do ver. Ou do vazio.

O vazio é visível.

E o visível é indizível.

É, de novo, o nada. Depois do tudo. Que não podia ser.

…10 dias… {arquive-se para memória futura V}

{o vazio não tem tamanho}

Quando 8 do 8 são 9 {arquive-se para memória futura IV}

Impaciente. Intolerante. Impossível de aturar. Incapaz de suportar o mínimo de barulho, seja ele o da rua ou o das conversas das mesas do lado.
Parcialmente neurótica, à beira do irracional.

Vontade de gritar e ao mesmo tempo de não emitir um som que seja.
Vontade de desaparecer para parte incerta, sem data ou prazo de regresso. Ou simplesmente fechar-me em casa, sem televisão, sem telefone a tocar, sem ter que responder a perguntas sobre se “já” estou melhor. Apenas aceito no meu telefone e respondo sempre às mensagens de um único remetente. De resto, a vontade é bloquear todos os números, é desligar o fixo e simplesmente cortar com o mundo.

Apetece-me vomitar palavras escritas à velocidade que me passarem pelos dedos. Fazendo sentido ou não, mas sentidas todas elas.

Faz-me falta o meu blog para isso mesmo. Porque é lá que essas palavras pertencem. É lá que tenho que depositar o vazio que trago cá dentro. Mas o blog tarda em voltar, por isso vomito aqui. Porque tenho que o fazer, porque sufoco nas palavras que tentam sair para algum lado.

Pouco me importa quem lê ou quem não lê. Não é para os outros, é para mim. É para um dia reler e perceber que os piores dias já passaram. E nessa altura vou perceber que, afinal, “já” estou melhor.

Por agora? Deixem-me estar. Assim. Doída. E a debitar palavras que me engasgam.

8 dias {arquive-se para memória futura III}

E de repente, ao telefone, perguntam-me: “então, já estás melhor?”
Respondo secamente que não. 
“E então ainda não estás melhor porquê?”

E na minha cabeça o “já” e o “ainda não” ecoam como um estalo, e não fazem sentido, e não têm nexo.

Como assim “já”? Como assim “ainda não”?

Uma semana. Passou-se uma semana. 8 dias. Depois de 8 semanas que foram 42 dias.

Como assim “já”?! Como assim “ainda não?!” Como assim isso tudo se ainda não tive sequer tempo para pensar unicamente em mim, para dedicar exclusivamente a mim?!

Como assim?!

Livro do bebé {arquive-se para memória futura II}

Juro que não procuro estas coisas, juro que tento até fugir delas. Porque fazem doer. Claro que fazem doer. Passaram apenas 8 dias e dói ainda. E muito. Não o corpo, que esse está a recompôr-se como previsto. Mas cá dentro. Por dentro. 

Nunca achei grande piada aos “livros do bebé”. Talvez porque nunca me tenha cruzado com nenhum particularmente interessante. Até porque nunca tinha procurado por “não precisar”. Sempre os achei todos demasiado lamechas, demasiado azulinhos ou cor-de-rosinha, muito piegas, muito cheios de mariquices e esquisitices.

Mas hoje…hoje fui, como tantas vezes vou, à papelaria aqui da rua. Fechar contas do mês, repôr material. Sempre de olhos no chão, como nos últimos dias. Enquanto esperava que a dona acabasse o que estava a fazer, fui vendo livros, olhando capas de revistas, folheando revistas de “costura criativa” carregadas de projectos alheios, confirmando que os meus pés continuavam lá, no chão, o único sítio para onde os meus olhos teimam em apontar.

Mas de repente…de repente cruzo-me com “livros do bebé”. Daqueles foleiros, piegas, maricas, lamechas, um cor de rosa, outro azul. E na prateleira de baixo…na prateleira de baixo o único livro do bebé que alguma vez me arriscaria a comprar. Da Rute Reimão. Cujo trabalho conheço há anos, cujo trabalho gosto tanto. Mal vi a capa, percebi que era um livro Rute Reimão. E pensei “bolas…”

Juro que não procuro estas coisas, nem procuro histórias de grávidas, nem grávidas, nem bebés. Afasto-me até. Mas, na prateleira da papelaria de todos os dias, o livro do bebé da Rute Reimão. Ali. A olhar para mim.

E eu aqui. A olhar. A pegá-lo. A folheá-lo. A doer-me tudo por dentro. Com vontade de explodir. Vazia. E a pensar apenas “bolas…” e a fazer um esforço enorme para não chorar ali.

O livro? Um bocadinho dele .:.aqui.:.

7

 

42 dias {arquive-se para memória futura I}

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Das fotos que sempre quis partilhar, dos testes que sempre quis ter.

Durou apenas 8 semanas, que se traduzem em 42 dias e não 56. A matemática, dizem, é uma ciência exacta. Mas na gravidez as semanas são 40 enquanto os meses são 9. E as minhas 8 semanas foram fisicamente 6. Mas, para os médicos, contam-se 8. Seja.

Já não se contam mais. Pararam ali. 2 dias depois de confirmar que o meu corpo não andava apenas a dar sinais de cansaço, mas de algo mais. O corpo em mudança, uma vida a formar-se cá dentro. 2 dias depois, uma visita de urgência ao Hospital São Francisco Xavier que confirmou que o que estava cá dentro não era para ser, não podia ser.

Mais 11 dias de espera por um processo que teimava em não avançar naturalmente. 11 dias de espera, no meio dos 42, para terminar de vez o que já se sabia não podia ser. Não era. Mas foi.

Durante 42 dias estive grávida. Hoje, hoje já não estou. Não era para ser, dizem-me. 
Dói. Fisicamente. Mas sobretudo emocionalmente.

Mas aprendi. Que tenho ao meu lado e do meu lado pessoas enormes que não me deixam cair. Que me estendem a mão. Que me acompanham. Que me lembram aquilo que eu digo tantas vezes aos outros: um dia de cada vez.

Também a isto irei sobreviver. Um dia de cada vez. Demore o tempo que demorar.

A quem foi sabendo ao longo destas duas últimas semanas o que se passava: obrigada pelo vosso apoio, pelo vosso carinho, pelo vosso mimo.
A quem não foi sabendo, mas ainda assim esteve lá sempre, mesmo às escuras: um obrigada ENORME, sem tamanho, porque mesmo às escuras me apoiaram nos dias mais doridos e doídos que vivi. E vivo, ainda.

De resto, já não consigo ouvir a frase “daqui a pouco tempo podes tentar outra vez”. 

Isto, estar grávida, é a única coisa que eu alguma vez quis com todas as forças. A única coisa que eu alguma vez desejei realmente. E quando achei que já não iria acontecer, aconteceu. E durou apenas 42 dias.

Um dia volto a tirar os olhos do chão. Prometo. Não o prometo a vocês. Prometo a mim mesma. 
Um dia volto ao sorriso fácil. À gargalhada sonora, espontânea e com gosto.

Um dia. Um dia de cada vez.

Obrigada, tanto, tanto, tanto, pelo vosso carinho e preocupação.

Não tinha que ser. E, pelos vistos, não podia ser.