Monthly Archives: September 2017

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Às vezes sinto-me embrulhada e enrolada em mim mesma. Sem saber muito bem como me desembaraçar disto. Mas depois lembro-me que me dizem que sou capaz de tudo aquilo a que me proponho. E lembro-me, também, daquela coisa que sinto que chamo de autonomia dependente. Se é que sequer existe. Autonomia para fazer (quase?) tudo, dependente de afectos e apoios.

……e não sei como sair disto……porque, cada vez tenho menos dúvidas, tudo isto assusta quem está de fora…

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“Tens que nutrir as tuas relações. Se não nutrires o que é que acontece? Deixam de existir.”

Nutrir relações… Por isso me fecho em casa no penúltimo domingo de Verão. A fazer de conta que o Mundo lá fora não existe e que tenho vontade de ficar aqui quieta. Não tenho. E o Mundo lá fora ainda existe. Talvez um dia deixe de existir. Ou o Mundo lá fora ou eu para o Mundo.

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“Percebes onde está a distorção? E o porquê?”

Percebo. Admito a distorção tantas vezes. Outras tantas apenas não entendo o que me chega e que acabo por distorcer…

“Estás outra vez à defesa. Estás nervosa. É por eu estar aqui?”

Claro que sim. Porque entendo o que me é pedido, só não entendo o motivo. E não quero, não posso, distorcer mais do que já o faço…

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Quero (muito) continuar a acreditar que tudo isto (ainda) vale a pena.

Mesmo as coisas mais pequenas. Mesmo as coisas maiores. Mesmo eu. Do tamanho que for.

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“Aqui podes estar como quiseres. Aqui é como se nos despíssemos sem necessidade de erguer defesas. Mas tu continuas à defesa.”

Depois de hoje, pouco ou nada de novo há a contar. Baixo a guarda todas as semanas, mas não deixo de ter a armadura vestida. Mesmo que dispa ali todos os meus segredos, todas as minhas histórias.

Ali estou, de facto, como quiser. Calada ou em lágrimas, em pé ou descalça, em silêncio ou perdida de riso. Mas sempre à defesa.

Ali, digo a mim mesma tantas vezes, é para confiar. Porque é ali que hei-de resolver tanta coisa em mim. Mas não consigo deixar totalmente a armadura à porta.

Porquê? Porque, diz-me ele, estou a projectar experiências negativas. Porque, digo-lhe eu, tenho medo de, novamente, sair magoada.

Quantas vezes já me despi, mesmo que não completamente como ali, para logo de seguida me magoar?

Jogo à defesa. Prefiro a indiferença à entrega. Já entreguei demasiado para demasiado retorno zero.

Ali é como se nos despíssemos. Mas eu mantenho a armadura.

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O Mundo é um lugar feio. Feio e que não se compadece de porra nenhuma!

Tantas vezes duvido dos passos que dou. Tantas vezes sigo a custo por não acreditar já que ainda vale a pena. Tantas vezes tiro os olhos do chão para olhar em frente e tê-los molhados em menos de nada ou coisa nenhuma numa conversa de circunstância de 15 minutos. Tantas vezes respiro fundo quando já não tenho paciência mas tenho que aguentar porque tem que ser. Tantas vezes repito que hoje não mas afinal hoje sim porque é assim que é.

Tantas vezes na corda bamba. No fio da navalha. No trapézio sem perceber onde está a minha rede de segurança.

Tantas vezes que me apetece simplesmente parar o Mundo. Aquele mesmo Mundo que é feio, tão feio, e que não se compadece de porra nenhuma! Parar o Mundo, deixar-me ficar quieta, sossegada no meu canto por um tempo. Não preciso de muito tempo. Só uns dias. Para voltar a mim mesma, para perceber em que ponto do meu caminho estou. Para poder respirar, erguer a cabeça, reencontrar coisas bonitas num Mundo tão feio e regressar ao meu caminho.

Preciso de parar. Não posso. Mas preciso, muito, de parar. Só um bocadinho. Mas ninguém me leva a sério quando digo que preciso, muito, de parar. Só um bocadinho… Por favor………antes que seja tarde.

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“Tu és instável. Sempre foste.”

Um dia hei-de conseguir não me lembrar disto que me disseste. Não digo esquecer, apenas não me lembrar. Por agora, todos os dias me lembro e todos os dias dias são um disco riscado na minha cabeça. “Tu és instável.”…”Tu és instável.”…”Tu és instável.”…”Tu és instável.”…”Tu és instável.”…”Tu és instável. Sempre foste.”…”Sempre foste.”…”Sempre foste.”…”Tu és instável. Sempre foste.”

…pára! Desliga-te na minha cabeça. Assim como tento desligar-te na minha vida, desliga-te na minha cabeça. Sei que apenas depende de mim. Desligar-te na minha vida e na minha cabeça. Sei que tu, por ti, já me desligaste há muito. E só tenho pena que não te ressoe nada na tua cabeça como ressoa na minha. Mas um dia conseguirei desligar-te. Desligar-te de mim, desligar-me de ti.

Tudo o que sobrou daquilo que nunca foi mais do que nada para ti e sei lá eu o quê para mim, tudo o que sobrou trago riscado na pele. Num desenho que saiu de mim tal como o meu filho, que também era teu, saiu: de dentro. Não sobrou respeito, que te tive tanto durante tanto tempo e que nunca me soubeste ter. Sobrou um desenho na pele que fica comigo para sempre e rancor e raiva e mágoa e……… De mim para ti não sobrou nada de bom. Mas, como tu mesmo dizes, eu sou instável. Por isso se calhar amanhã já não é nada disto e sim o seu contrário.

Não. Não é verdade. Porque amanhã ainda é cedo para fazer as pazes. Não contigo! Porque não se faz as pazes com quem não está presente e menos ainda com quem não quer estar presente. Farei as pazes um dia, sim. Mas comigo mesma. E com o Mundo. O Mundo que desprezo quase tanto quanto te desprezo a ti. Não. Também não é verdade… Não desprezo o Mundo. A ti, neste momento, sim. Mas eu sou instável, não é? Por isso posso oscilar entre a indiferença e o desprezo, não posso? Entre a raiva e a mágoa… Instável, dizes-me que sou…

Serei sempre. Para ti, para o Mundo, serei sempre instável. “Sempre foste.” Mas será nessa instabilidade que continuarei a crescer, que continuarei a aprender a silenciar as vozes, até a tua!, que continuarei a caminhar em frente. Mesmo que, tantas vezes, em frente me leve até à beira do abismo. Porque eu sou instável, sempre fui.

Posso ser tudo aquilo que me quiseres rotular. Mas serei sempre, como sempre fui, muito melhor do que tu alguma vez ousarás sequer pensar ser.

“Tu és instável. Sempre foste.”. Mas nunca deixei de ser eu, igual a mim própria.