Daily Archives: 16/06/2025

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Recolhida na minha bolha. Envergo novamente a minha armadura. Oiço o silêncio de quem tem pressa, de quem perdeu o encanto da novidade…

Sinto a ausência. Permito-me sentir. Tudo. Questiono-me. Sobre tudo. Oiço as respostas que eu própria dou às minhas perguntas. Se as respostas estão correctas? Dou por mim, horas depois do fim do silêncio, a acreditar que as respostas que eu própria dei às minhas questões não são as respostas certas, correctas. Porque existe mais realidade para lá das minhas inseguranças. Dos meus medos.

Os meus medos, esses sim!, são reais. O medo da perda. O medo do abandono. O medo da rejeição, da não aceitação do meu novo normal. O medo… Acima de tudo, o medo. E o refrão de uma música que se repete há anos na minha cabeça: “a vida é sempre a perder!“… E é.

Na minha bolha continuo a fazer de conta. E depois de colocar a minha armadura faço de conta. Que não tenho medo. Que já me habituei a perder e que cada nova perda já não vai doer. Sou perita a fazer de conta. De tal forma que roço a perfeição quando digo que não me dói aquilo que, na realidade, me corrói por dentro.

São muitas coisas a acontecer ao mesmo tempo. E nem todas são boas. Ou quase nenhuma é boa. E é também por isso que recolho à minha bolha onde poucos conseguem aceder. Onde poucos sabem como aceder. Onde poucos, raros!, querem aceder…

Na minha bolha faço de conta. Que está tudo bem. Que não se passa nada. Que sou confiante o suficiente para não ter medo. Da perda. Do abandono. Da rejeição. Da não aceitação.

Na minha bolha. Cor de rosa. Como se fosse uma bola de sabão.

Amanhã, se for preciso, continuarei a fazer de conta. E já sei que vai ser preciso.

Depois? Logo se vê…

Na minha bolha. A fazer de conta.

Na minha bolha. A fazer de conta. Que não vi. Que não sei. Que não li. Que não senti. Que não vivi.

Na minha bolha. Armadura vestida depois de observados os danos recentes que se juntaram aos danos anteriores. Como cicatrizes, no corpo e na memória, contabilizam histórias. Bem ou mal contadas, são histórias que fazem ou já fizeram doer. Que fazem parte. Que me fizeram crescer.

…que me fizeram endurecer

Endurecida, mas não amarga. Apenas consciente da e na distribuição do que não amargou. Como os meus lápis de cor, que trago em mãos, prontos para distribuir cores por aí. Faltam-me as telas que já foram paredes que já foram pele. Assim como me faltam as letras que formam palavras das cartas que não escrevi. Da carta que, prometida, não cumpri.

Na minha bolha. A fazer de conta. Que não vi. Que não sei. Que não li. Palavras, em verso ou em prosa, faço de conta que não senti. Que não vivi.

Na minha bolha onde poucos, raros!, entram. Porque eu não deixo. Ou porque não tentam sequer. Na minha bolha, uma espécie de Mundo do Faz-de-Conta. Onde já tudo foi possível. Onde hoje só eu existo. Eu e a minha armadura na minha bolha a fazer de conta.

São só palavras, dizem-me. Sempre me disseram. São só palavras que aproximam. São só palavras que afastam. Mas são só palavras. Falta o toque. O arrepio na pele. As borboletas na barriga que me morreram há tanto tempo com um murro no estômago. Já não morreriam hoje com a protecção da minha armadura.

Palavras como gestos ou movimentos, coisas que nos habituamos a dar como garantidas. Não na minha bolha. Aqui já aprendi a abrir mão de tudo, menos dos meus lápis de cor. E enquanto o silêncio se repete, enquanto o silêncio se mantém, na minha bolha ecoa a certeza de que nada pode ser dado por garantido. De que ninguém pode ser dado por garantido. E muito menos eu, com a minha armadura, me permito sequer ser dada por garantida. Porque não o sou, de facto…

Estão 30 graus lá fora. Está demasiado calor. Mas a armadura…? Essa mantêm-se agrilhoada…

Da pressa. E o fim do encanto…

Segunda feira, um calor infernal e impeditivo de ir à rua, um café em casa que aconteceu já há algum tempo, os lápis de cor da minha bolha que se resumem ao lápis preto enquanto esperam por uma oportunidade para a abertura do leque de cores que, durante algum tempo, me preencheram os dias, o silêncio de quem tem a pressa de quem perdeu o encanto do que é novidade e não se queda mesmo com medo, mesmo com dúvidas porque encontra em mim aquele contraponto que é o não ter pressa. Que eu não tenho. Deixei de ter.

Porque eu opto sempre pelos caminhos mais difíceis, porque eu opto sempre por cuidar do que existe de facto, porque eu opto por fazer crescer tudo aquilo que construo. Sim, mesmo com medo. Sim, mesmo com dúvidas. Sim, mesmo cansada. Por dentro, onde me pesa tanto tudo o que sinto, tudo o que vivo. Mas deixei de ter pressa.

A armadura prende-me os movimentos para evitar aquele passo que sei ser desastroso. Protege-me do impacto silencioso do confronto com uma realidade que me chegou sem convite.

O silêncio. E eu não tenho pressa. De armadura que me protege do silêncio. Acolhida pela minha bolha onde os meus lápis de cor aguardam pacientemente o seu tempo também sem pressa.

Terminou o encanto da novidade? Para mim não. Todos os dias, desde que sem pressa, encontro novos pontos de encanto que me fazem querer dar uso aos lápis de cor fora da minha bolha. Mas, por agora, será na minha bolha que permaneço sem pressa. Ainda a deixar-me levar pelo encanto do todo, novidade ou não. Até ao dia em que, na minha bolha, a minha armadura me impeça de dar mais um passo que seja. Em direcção ao silêncio. De quem tem pressa e deu por terminado o encanto da novidade…