Cheguei a casa, à hora de almoço, e na televisão, em directo de Gondomar, o Primeiro Jornal da SIC acompanhava os preparativos para os velórios de Diogo e André. Os velórios que ninguém queria com aquelas idades, 28 e 25 anos…
Depois de contarem os percursos de Diogo e André no futebol, nacional e internacional, uma ligação a Liverpool. Ao estádio onde tantas vezes se cantou “His name is Diogo” e para onde agora os adeptos se dirigiam. E a certa altura o repórter refere a quantidade de camisolas e cachecóis que os adeptos iam deixando em homenagem a Diogo. E, estupidamente!, dou por mim a pensar “mas porque é que deixam camisolas e cachecóis…?” para, subitamente, levar um daqueles estaladões que não se vêem e ouvir a minha própria versão aos 13 anos a gritar com a minha versão dos 48 e a relembrar “TU TAMBÉM DEIXASTE O TEU LENÇO DOS ESCUTEIROS NO CAIXÃO DO RICARDO!“…
…foi há 35 anos. Continua a doer hoje como doeu aos 13 anos. E sim, no dia do funeral, aproximei-me do caixão do Ricardo, tirei o meu lenço de Júnior, investidura há tão pouco tempo, e deixei-o em cima daquele corpo que, para mim, já não era o Ricardo. Deixei o lenço simplesmente porque o senti na altura. E hoje percebi porque o fiz. 35 anos depois, percebi.
A morte do Ricardo, aos 13 anos, levou também um pouco de mim. Um pouco de nós todos. E, por isso mesmo, deixei com ele o lenço de escuteira que, por insistência dele, voltei a ser 3 anos depois. Eu deixei o meu lenço. Tantos de nós deixaram também. Lenços. Bóinas. Facas de mato. Pedaços de cada um que ficaram ali, parados no tempo de uma morte inesperada. Que nos marcou a todos. A ferro quente. Porque não é suposto perdermos ninguém com aquela idade. Naquela idade. Um vizinho. Um amigo. Um irmão. No meu caso um namorado…
Percebi então a entrega de camisolas e cachecóis dos adeptos no estádio do Liverpool pelo Diogo. Porque, com o Diogo, com o André, também cada um daqueles adeptos perdeu um pouco de si.
Hoje fez-me sentido. 35 anos depois. Fez-me sentir…
…35 anos depois ainda dói. Muito…
