Nada acontece por acaso e não é por acaso que os cafés e o vinho se misturam por aqui. Porque faz sentido que se misturem, mesmo que misturas destas possam ser pouco recomendáveis.
Há cafezinhos que volta e meia se repetem, com a importância que um café tem. As borboletas na barriga não passam de moínhos de vento e a euforia do início abrandou para a quase rotina de um café só porque sim, porque estamos em caminho.
E depois há o vinho. Que há tanto tempo me apetecia, mesmo não bebendo, não sabendo beber, nunca tendo bebido vinho na vida. Ou tendo bebibo apenas para provar, para lhe sentir o sabor uma vez que fosse.
Mas há muito tempo que me apetece, tanto, um copo de vinho. Só porque sim, porque a simples imagem de estar com um copo de vinho na mão me relaxa, e o que eu preciso de relaxar! E desanuviar. E simplesmente estar e saborear.
Estar no aqui e no agora. E o que é aqui e agora é o que é. O resto? O resto vem depois, se tiver que vir, o que tiver que vir. Porque não tem que vir, não tem que ser. Interessa apenas o aqui e agora.
E ontem. Ontem um copo de vinho ao jantar, ou foram dois? Ou um com acrescento. E duas ginjinhas. Ou foram 3? Aqui não me recordo, mas a ginjinha is the new long drink. De tanto tempo que demorou a ser bebida. Como o vinho. Demorado. Degustado. Apreciado. A acompanhar o jantar, mas que não precisava de companhia, bastava o vinho. Não. Não se bebe vinho assim. Acompanha-se, sempre. Porque sim. Porque o vinho não é para ser bebido a sós. Ou é, mas não é.
E o vinho foi tudo o que eu sabia que ia ser. A descontração. A sensação de “finalmente estou solta”. O sorriso parvo sem motivo. Mas convicto. E sincero. E o sorriso a saber-me bem. Como há muito, tanto tempo não sorria. E as risadas. Só porque sim, porque o vinho era bom, a companhia também. A ida ao terraço mas oh bolas começou a chover, já não vamos! Arriscaria a dizer que foi a noite perfeita, ao fim de tanto tempo, a noite perfeita. Porque houve vinho. E não é o vinho o mais importante, mas é. “Dizer isso assim até parece conversa de bêbados.” Parece mas não é e como dizê-lo de outra forma que não assim, o vinho? É dizê-lo como disse ontem, “era mesmo isto que estava a precisar”, o quê, o jantar?, “não, o álcool”. E rir porque na verdade ainda soa pior.
E sim, bebi vinho e soltei uma parte de mim que andava há tanto tempo esquecida, adormecida, e fiquei alegre como só o vinho deixa, e fiquei com o peso do vinho nos joelhos, nos braços, e ri, e conversei, e ouvi, e vi, e deixei-me estar, e deixei-me levar, e deixei-me ir.
E percebi, como já tinha desconfiado com o café, percebi com o vinho que sim, estou viva. E estou de volta. Sou eu novamente, a mesma que lá para os finais dos anos 90, lá para meados de 98 começou a adormecer, a desaparecer, a não existir numa espécie de hibernação que só há pouco, tão pouco tempo terminou.
E caramba, estou viva, estou aqui, estou agora! Com café, com vinho. Com nada disto, com tudo. E sabe tão bem…sabe tão bem saber que sim, que estou de volta, a mesma eu com quem não me cruzava há tanto tempo, que há tanto tempo não reconhecia no espelho.
Para melhor, para pior? Melhor, decididamente melhor. Mais segura, menos ingénua, menos “tonhó”, mais decidida. Com medos e inseguranças e ansiedades, claro, mas acima de tudo sem pressa porque não adianta ter pressa, nada resolve ter pressa e é só o aqui e agora. O que tiver que acontecer é aqui e agora. Porque é só aqui e agora que acontece. Porque ontem já aconteceu e amanhã quem sabe.
Não, não me preocupo com o vinho. Haverá vinho quando tiver que haver. Preocupo-me ainda menos com café. Café bebo-o sempre, todos os dias. Sozinha, acompanhada, a dois, a três, a tantos. Os cafés que forem. E entre vinho e café, prefiro, obviamente, o vinho.
Sejam lá o café e o vinho aquilo que forem para além de simples café {cheio, forte, sem açúcar} ou vinho {tinto, apetece-me tanto tinto, ou branco/verde quando o tempo voltar a aquecer}.