Esta tarde o Mar estava muito calmo, praticamente sem ondas. Mas, ainda assim, duas raparigas nas suas pranchas tentavam apanhar o que, de vez em quando, aparecia. Até que uma delas desistiu e voltou para terra. A outra, agora sozinha num Mar sem ondas, sentou-se com a prancha entre as pernas e deixou-se ficar. Simplesmente ali. Sozinha. Ela, o Mar e o que quer que fosse que se passasse naquela cabeça.
E é isto, precisamente ISTO que eu invejo nos surfistas. Este momento. De reflexão? Talvez. De relaxamento? Provavelmente. Mas é um momento que considero quase perfeito. Sei que, para mim, seria um momento doloroso, porque seria eu, a prancha e as vozes na minha cabeça…
Gostava que me dissesse, quem faz ou já fez surf, se neste momento as vozes se calam…
Para mim, já o disse, seria doloroso. Não só pelas vozes na minha cabeça mas também pela solidão. Porque NÃO está lá mais ninguém. E eu sei tão bem, bem demais!, o que é não estar lá mais ninguém… E é das coisas que mais me dói…
Independentemente de ser ou não um momento de solidão, é dos momentos mais bonitos do surf. Apanhar as ondas? Atravessar correntes e vir ter a terra? Equilibrar-se em cima de uma prancha enquanto esta rasga o Mar? Claro que tudo isso é bonito de assistir. Mas ficar a ver um surfista sentado na prancha, em silêncio, num Mar sem ondas, sem mais ninguém por perto…a simplesmente estar ali, a viver aquele momento…é único. E é lindo.
Tenho que voltar à praia rapidamente. E começar a controlar as marés. Para saber quando é que posso ir caminhar à beira mar. Tenho tantas saudades de o fazer. O ano passado já senti alguma dificuldade em caminhar na praia, especialmente na areia seca e, ao aproximar-me da beira da água, lembro-me que o movimento das ondas me desequilibrava. Muito. Mas este ano quero superar isso, quero poder caminhar na areia molhada e sentir a rebentação nas minhas pernas. Bem…pelo menos até aos joelhos. Não me sinto confiante para mergulhos. Mas quero sentir a água a molhar-me os pés, a cobri-los. E os pés a enterrarem na areia com a chegada das ondas…
Claro que, para caminhar à beira mar, tenho que contar com a presença da minha mãe, o meu grande, enorme!, apoio.
Esta semana já sei que, à tarde, a maré vai estar cheia. Por isso, aponto para as tardes da próxima semana voltar ao paredão e descer até à praia. Sei que não terei aquele momento de estar sozinha comigo mesma em cima da prancha num Mar sem ondas. Mas sei que me fará muito bem ir até lá abaixo e sentir o Mar a tocar-me a pele…
