Domingo e aquela guerra interior comigo mesma: sair de casa para dar uma volta, ir até à vila, quem sabe o paredão, ou simplesmente ir beber café à esplanada junto ao parque e dar uso às pernas ou ficar a descansar, a poupar as pernas que ainda doem do passeio de ontem a seguir ao almoço pelo paredão para amanhã estar em condições?
O dia lá fora estava bonito, é verdade. Mas a Nortada veio com força e, pelos vistos, para ficar. Sair de casa com vento forte e frio não é o mais apetecível. Fiquei por casa, entre o sofá e o cadeirão e tentei esvaziar a cabeça daquelas coisas que não interessam mas que, ultimamente, me acompanham diariamente. Eu, overthinker assumida, consegui (não sei como!) desligar do que não me faz bem. Seria mais fácil se tivesse adormecido no sofá depois do almoço, como tem acontecido quase todos os dias. Mas desta vez não.
Mas, não sair de casa, faz-me sentir prisioneira. Estou cansada de estar em casa. É verdade que saio de casa para a fisioterapia, para o Yoga, para o café ao final do dia. Mas não me chega. Faz-me sentir muito condicionada, como se não tivesse autorização para ir a mais lado nenhum. Bem, na realidade não tenho autorização para grande liberdade por causa da baixa, mas ao mesmo tempo fazia-me bem sair um bocadinho daqui…
Se tudo correr bem, na sexta feira irei sair daqui um bocadinho. Com sorte, é desta vez que assisto ao pôr do Sol na baía. Vamos ver se não há alterações de última hora e, até, se o estado do tempo ajuda. Recordo-me que, quando tentei ir assistir ao pôr do Sol na baía, para além de chegarmos em cima da hora, havia poeiras do Norte de África presentes. Não quero nada disso desta vez. Quero, sim, sair daqui por um bocadinho. E só o sair daqui já vai ser tão bom.
Entretanto, amanhã começa a rotina mensal de análises ao sangue para controlar eventuais efeitos da terapêutica preventiva no fígado. Ou seja, é dia de regresso ao Hospital. E, claro, terminada a recolha de sangue, tenho que passar pelo piso da Neurologia para tentar perceber se há novidades. Porque os 30 dias desde a primeira toma da terapêutica preventiva estão a chegar ao fim. E, mesmo que a terapêutica preventiva seja para tomar durante 9 meses, depois dos primeiros 30 dias já é possível avançar com a medicação biológica que preciso para o que tenho. E isso implica que haja uma consulta que eu aguardo há meses.
Eu juro que consegui passar o dia todo hoje sem pensar em nada disto. Mas agora, de repente, do nada!, veio tudo…
Não quero continuar a falar e/ou pensar nisto. Amanhã há fisioterapia, seguida de análises e depois regresso a casa para almoçar e aterrar no sofá. E, por muito que o sofá seja confortável, e é!, por muito que goste dele, e gosto!, estou cansada de passar os dias no sofá sem fazer nada que não seja ver o tempo passar…
E já me estou a perder novamente no que não interessa!
Hoje, ao final do dia, acabei por sair de casa. Fui beber café com a minha mãe e uma dor de cabeça que ameaçou não me largar. Na esplanada, que não a do costume e também não a que eu queria, muito barulho, muita confusão, muitos grupos a falar muito alto, muitas crianças com as suas vozes muito agudas…tudo muito! Tudo demasiado para a minha dor de cabeça. Decidi ir dar uso às pernas, não me apetecia voltar para casa.
Fomos em busca das cores do final de dia no sítio onde, quando chegava de autocarro depois do trabalho, apanhava cores bonitas. Mas, ao chegar lá, fui lembrada à força que o Sol já não se põe no mesmo sítio nesta altura do ano. Agora já se põe atrás dos prédios e as cores bonitas do final do dia já se escondem à hora que lá cheguei…
Um bocadinho desiludida, claro. Mas, pelo caminho, os cães a quem disse “Olá” e me permitiram dar-lhes festas e ainda o escaravelho com que me cruzei fizeram valer a pena o uso dado às pernas.
Os meus dias, na verdade, são realmente aborrecidos. Ainda não descobri o que posso fazer para os tornar mais interessantes. Mas hei-de descobrir. Até lá, e ao passar no cemitério, lembrei-me das sábias palavras que me disseram sexta feira: “a vida não acaba”. E já sei que não, apenas nasce uma nova vida. E é essa que eu ainda não sei como e qual vai ser…
Tinha pensado em deitar-me cedo hoje. Claro que já não vai acontecer… Mas tenho que voltar a obrigar-me a ir para a cama cedo. Afinal, dormir pouco não me faz bem nenhum e amanhã, dia de fisioterapia, é dia de acordar muito cedo. Por isso, mesmo não sendo cedo, está mais do que na hora de ir tratar de mim. E acreditar que, amanhã, vai ser melhor. Porque eu quero que assim seja.
