Ainda de sexta feira à noite: acho que foi ainda durante o jantar, já não me recordo do momento exacto. Ou estávamos a atravessar a feira. Não importa. Estávamos na baía do Seixal onde eu há tanto tempo queria ver o pôr do Sol. E vi. Mas não é isso o importante agora.
O importante foi aquele momento em que P de Presente, P de Presença, me disse “tu hoje até estás a andar muito bem“. Sorri. Era verdade, caminhar estava a ser fácil, sem muitos desequilíbrios e sem necessidade de ter apoio à direita, de braço dado. E depois de sorrir, ri um pouco porque estava a olhar para o chão e respondi: este chão é direito, é fácil de manter o equilíbrio, não é como a calçada deformada pelas raízes das árvores ou por pedras soltas, porque o maior desafio é, de facto, caminhar em calçada.
Lembro-me que, naquele momento, sorri…
Mas a miúda do sorriso fácil já não sorri tanto ou tão facilmente como antes. Em casa, por exemplo, dificilmente esboça um sorriso. Raramente solta uma piada. Porque ou está muito cansada ou, como hoje, tem uma dor de cabeça infernal desde as 5h da manhã…
Comenta a visão dupla, mas já nem sobre isso consegue fazer uma piada…
Quando vai à rua, mantém a simpatia e boa educação no café, e com grande esforço lá mostra um pequeno sorriso. Reforça ao dono que não consegue ir buscar um cinzeiro porque o risco de queda é grande. Um estranho, sentado na esplanada ao lado dos cinzeiros, levanta-se e traz-lhe um à mesa. Agradece profundamente e retribui o gesto com um sorriso pequenino.
A miúda do sorriso fácil era eu. Ou fui eu em tempos. Mas nos últimos tempos o sorriso sai a ferros, mesmo tendo a companhia de Presentes ou Presenças.
Hoje, mais uma vez, a vontade é de chorar. Mas não choro. Porque continuo a não conseguir fazê-lo. Vou guardando tudo para dentro, especialmente a (enorme) frustração de já não conseguir ser como era, de fazer como fazia, de sorrir facilmente como sorria.
Não, a miúda do sorriso fácil não tem sorrido tanto como sorria. E, por muito pateta que possa parecer, tem saudades de caminhar num piso fácil como o da baía do Seixal…
E continua a contar pequenas vitórias todos os dias em que sai à rua: continua sem ter caído uma única vez!
