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Misto de emoções. Na verdade, uma verdadeira explosão de mixed feelings

Há muitos anos que dizia que era órfã de pai vivo. Hoje digo que sou órfã de pai morto.
O meu pai morreu. Não sei ainda se hoje de manhã, se durante a noite, não importa. O meu pai morreu. Ontem ou hoje? É indiferente.

Nunca foi um pai perfeito. E há mais de 30 anos, praticamente 40 na verdade, sempre foi um pai ausente. Distante. Daqueles que, a partir de determinado momento, só se aproximou porque queria alguma coisa em troca pelo seu papel de pai.

Soube há pouco tempo que estava muito ofendido comigo porque eu não uso o apelido dele. Na verdade, não uso apelido nenhum. Gosto muito da combinação dos meus dois nomes próprios. E ele nunca aceitou isso. Como também nunca aceitou tanta coisa…

Mas, mal ou bem, era meu pai. E o meu pai morreu hoje.

Estou num verdadeiro estado de mixed feelings. Acho que ainda não me caiu a ficha…

Se vou ao funeral? Como filha, devia ir. Mas já estava órfã há tantos anos, mesmo que com o meu pai vivo.

Mas hoje o meu pai morreu. E eu não sei o que sentir, nem o que pensar ou fazer…

Hoje o meu pai morreu. Fecha-se um ciclo. Depois? Logo se vê…

——-

Não, a ficha ainda não caiu. E não, ainda não consegui responder a todos os que, de alguma forma, me estenderam a mão.
A ficha há-de cair. Não sei como nem quando. Só sei que um dia vai cair.

Ainda irei agradecer a todos, um por um, o terem-me estendido a mão. Não sabem o valor que isso tem para mim.

Já decidi que quero estar presente no funeral. Nem que seja a única dos 4 filhos a lá estar. Nem que seja a única pessoa a lá estar. Não sei, ainda, quando vai ser. Nem onde vai ser. E, mais importante!, seja lá onde for o funeral COMO é que vou para lá…não tenho carro, não sei se tenho boleia (o que duvido), se for para ir de transportes públicos como é que vou fazer para conseguir. Mas é preciso fechar um capítulo. EU preciso fechar um capítulo.


De resto, continuo a dizer: a ficha ainda não caiu. Um dia acabará por cair. E, nesse dia, logo se vê. A única coisa que eu sei é que o meu pai morreu hoje. E a ficha teima em não cair… E, percebi esta tarde, tenho 2 processos de luto para fazer. O luto referente ao período em que eu era órfã de pai vivo. Luto que nunca fiz. E, agora, o verdadeiro luto de uma filha a quem o pai morreu hoje. Eu, oficialmente órfã de pai. E o meu pai, que morreu hoje

——-

E as horas vão passando, nem sei se rápido ou devagar. Sei apenas que estou muito confusa. Não sei o que sinto, nem sequer sei se sinto alguma coisa. E não percebo este vazio que subitamente se instalou em mim. E o sentir-me perdida e sem chão… E só me ocorre perguntar “como assim, perdida e sem chão por causa de alguém que me deixou para trás há mais de 30 anos e que, quando se reaproximou, foi apenas e só para pedir algo em troca do seu papel de pai, que nunca soube cumprir!, e prejudicar tanta gente à sua volta, incluindo eu?!

Confusa. Muito confusa. Tão demasiado confusa. E em luta comigo mesma porque teimo em não querer ir para a cama. São 3h da manhã, acordei às 7h, caiu-me isto no colo. E a única coisa que eu precisava agora era de um colo para deitar a cabeça e respirar fundo para organizar as ideias. O colo dele onde eu pudesse deitar a cabeça, ficar em silêncio, respirar fundo e sentir os dedos dele pelo meu cabelo. Era só isso que eu precisava neste momento para serenar e aceitar que tenho que descansar, tenho que ir dormir. Mas ele não está aqui…está sempre comigo, é verdade, sinto-lhe a presença quando aninho e enrosco para dormir. Mas ele não está aqui. E tudo seria tão mais fácil de enfrentar nos próximos dias com ele a caminhar de mão dada comigo.

Não está aqui. Está a 135km. Ou à distância de um clique. Mas, não estando aqui, o importante é que está sempre lá.

Mas, o que fica do dia de hoje, é só isto: o meu pai morreu hoje

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